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EXPOSIÇÃO

do

OFÍCIO

de

SÃO BRUNO

e dos

SANTOS MONGES

CARTUXA DE SCALA COELI

2014
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HOMENAGEM

E LEMBRANÇA

DE AMOR FILIAL

A NOSSO PAI
SÃO BRUNO
NO QUINTO CENTENÁRIO
DA SUA
CANONIZAÇÃO

1514 -19 JÚLIO - 2014

CARTUXA SANTA MARIA SCALA COELI

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PRÓLOGO

Acho que nenhum Prólogo será


melhor para as páginas que seguem, do
que transcrever a Carta Circular do
Reverendo Padre Dom François Marie a
respeito do V Centenário da Canonização
do nosso Pai e Fundador, São Bruno.
Diz assim:

Très chers dans le Christ,


L’objet principal de cette lettre de début d’année est
de vous rappeler un événement important qui la
marquera et qui peut être pour nous tous l’occasion
de grandir dans une fidélité toujours renouvelée à
notre vocation. L’essentiel de ce que j’ai à dire a déjà
été exprimé dans l’Exhortation qui figure au terme
de la Carte du dernier Chapitre Général de nos
sœurs.
« Le 19 Juillet 1514, à la demande du Révérend
Père Dom François du Puy, le Pape Léon X
inscrivait notre Père saint Bruno au catalogue des
saints et autorisait notre Ordre à célébrer sa fête.
Nous souhaitons vivement que cet événement soit
pour nous l'occasion de raviver les liens filiaux
qui nous unissent à lui.
Profitons des mois qui viennent comme d'un
temps favorable pour nous laisser interpeler

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davantage par le témoignage lumineux de sa vie,
pour nous imprégner du trésor de ses
enseignements, pour recourir avec pleine
confiance à son intercession paternelle.
Ô Bonitas!

Après quelques décennies passées à Reims,


où il était très en vue, notre Père Saint Bruno est
venu au désert pour y vivre caché. Il y est demeuré
résolument fidèle à son propos. Dans sa solitude de
Chartreuse puis de Calabre, on ne le voit plus
intervenir dans la vie de l’Église, il n’enseigne plus,
ne donne de leçons à personne, ne se met jamais en
avant. Dans ses lettres, il ne se présente même pas
comme un maître spirituel, mais seulement comme
un ami fidèle, comme un père très aimant, tout
humble, effacé, qui se sait et se reconnaît pécheur.
Ses fils, ses frères, après les demandes de prière à
son intention en usage à cette époque et dont
témoigne le rouleau funèbre, ne se sont pas soucié
de faire connaître sa sainteté à la postérité. Ils ont
vécu de son exemple, ils ont marché sur ses traces.
Cependant, il y a un temps pour tout. À
l’aube du XVIe siècle, le Révérend Père Dom
François du Puy se sentit poussé à intervenir pour
raviver la mémoire du fondateur et Père de notre
Ordre. Et ce fut le retour des Chartreux dans notre
chère maison de Calabre, le 27 février 1514, et
surtout sa canonisation équipollente par le Pape
Léon X, le 19 juillet. Celle-ci entraînait pour notre

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Ordre la possibilité de célébrer sa fête, l’instauration
d’une commémoration quotidienne en son honneur,
l’introduction de son nom dans les litanies des
saints. Le jour de la Toussaint, l’autorité
ecclésiastique procédait à la reconnaissance officielle
de ses reliques. En 1515, le Révérend Père Dom
François du Puy fit imprimer une Vie de Saint Bruno,
la première à être publiée et, en 1516, le Chapitre
Général prescrivit que des extraits de cette
biographie soient lus chaque année au réfectoire le
jour de sa fête. D’un seul coup, sa mémoire
s’imposait dans toutes nos communautés.
On connaît l’adage du Pape Benoît XIV nous
concernant : « Cartusia sanctos facit, sed non patefacit ;
la Chartreuse produit des saints, mais elle ne les fait pas
connaître ». La demande de la reconnaissance de la
sainteté de notre Père Saint Bruno par notre Ordre,
après plusieurs siècles de quasi oubli, fut l’exception
légitime qui confirme cette règle. La divine
Providence fut sans doute à l’origine de cette
initiative inhabituelle chez nous. A la veille des
grandes tempêtes et des bouleversements qui
allaient secouer la chrétienté quelques années plus
tard, il n’était pas vain que notre Ordre voie son
unité et son charisme propre réaffirmés par une
référence plus claire à son Père et fondateur. On peut
penser en effet que cette véritable redécouverte de
notre fondateur par nos pères du début du XVIe
siècle fut pour notre Ordre, - alors à l’apogée de son
développement, avec 198 maisons, - l’occasion d’une
plus claire prise de conscience de son identité et de

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son ancrage dans la grande tradition monastique de
l’Église. Celle-ci contribua sans doute à le préserver
de manière toute spéciale des défections nombreuses
qui affaiblirent alors bon nombre d’Ordres religieux
et soutint le courage de tous ceux qui eurent à
souffrir des affrontements cruels qui secouèrent
toute l’Europe pendant plusieurs décennies : 39
chartreuses furent alors supprimées et plus de 50 fils
et filles de Saint Bruno versèrent leur sang pour la
foi.
Pour nous, Chartreux du XXIe siècle,
l’anniversaire de la proclamation de la sainteté de
Bruno nous rappelle à l’essentiel : notre propre
vocation à la sainteté sans laquelle notre vie séparée
du monde n’a pas de sens.

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Apoteose de S. Bruno
Zurbarán

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ADVERTÊNCIA PRELIMINAR

Como o Rvdo. Padre deixou às


Comunidades a iniciativa para celebrarem ao
seu modo este Centenário da Canonização do
N. P. São Bruno, nós aproveitamos esta
efeméride e essa liberdade para expor ou
comentar o Ofício Cartusiano dos Santos
Monges. Se para nós S. Bruno é o “primeiro
monge cartuxo”, nada melhor, pensamos, para
celebrarmos este Centenário, do que explanar
esse Ofício em sua honra aproveitando o mais
possível os seus escritos. É um modo simples
para uma lembrança filial dos seus
ensinamentos.

Antes, porém, de começar, vamos


satisfazer uma legítima curiosidade que pode
assaltar ao leitor: Como é que aparece no nosso
rito o actual Ofício dos Monges depois de nove
séculos da ausência do mesmo?
É verdade que, no percurso da nossa
Historia, nalgumas Províncias da Ordem e
depois da canonização do nosso Fundador,
surgiu a petição dum “Ofício próprio” para o
mesmo. Todavia, o Capítulo Geral nunca quis
anuir a tal desejo, julgando que o Ofício
empregado para sua festa, o de Confessor não

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Pontífice daquele tempo, era muito apropriado
para a sua celebração.
Então, como apareceu na nossa Liturgia o
actual Oficio dos Monges? Foi um fruto da
Renovação Litúrgica empreendida pelo
Vaticano II. Como se deu esse facto? Para
responder satisfatoriamente esta pergunta,
nada melhor do que ouvir a génese do mesmo,
tal como a expôs o Presidente da Comissão
encarregada para a composição do “Ofício do
Monges”, para a nossa Ordem. É muito
interessante o seu processo. Diz assim:
« Quando se iniciou na nossa Ordem a
renovação do Missal Cartusiano, apareceu esta
importante novidade: a reunião dos Santos em
diversos grupos, os “Comuns”, recebeu uma
interessante modificação, guiada por critérios
diferentes aos do passado. O critério que
inspirou a nova disposição dos Comuns quis,
antes de mais nada, evitar os conotados que
poderiam ser considerados “negativos”, v. gr.
“Confessor não Pontífice”, “Virgem não
Mártir”, “Santa não Virgem”, etc., para pôr em
relevo e com uma nova luz a natureza da
vocação peculiar a que pertenciam os Santos
correspondentes a cada Comum.
Ora, se o tal novo “reagrupamento”
começou pelo Missal, era evidente que devia
também estender-se necessariamente ao Ofício
Canónico, dada a íntima dependência e inter
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correlação existente entre o Ofício e a Missa,
centro, esta, imprescindível daquele.
Isto impôs, por exemplo, a necessidade
de especificar um pouco mais o Ofício dos
Doutores que, até então, só tinha tido uma
única Missa para todos eles, dando-lhes alguns
elementos próprios e condizentes à missão
mais específica exercida por eles na Igreja.
Esse mesmo critério deixou ao
descoberto outra lacuna: no nosso rito não
existia um “Comum dos Monges”, nem
nenhum “Ofício” nem Missa específicos para
eles. Foi preciso, portanto, satisfazer essa
necessidade e pensar na composição dum novo
Ofício para os Santos monges.
Não é preciso dizer que esse novo Ofício
deveria estar em consonância com a nossa
vocação e Liturgia. Como é natural, esta tarefa
encontrou-se com numerosas dificuldades e
condicionamentos. Com efeito, o novo Ofício
de Monges deveria inserir-se com naturalidade
entre os Ofícios ou Comuns já existentes. Por
outro lado, não se podia pensar em novas
composições melódicas estranhas ou alheias ao
nosso repertório musical; por isso, somente
podia contar-se com os elementos e peças já
existentes nos nossos livros e com os textos
litúrgicos empregados nos mesmos.
Isto fez com que o novo Ofício ou
Comum de Monges no nosso rito tivesse desde
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o seu “nascimento”, “a natura”, e como que
necessariamente, um carácter de “mosaico”.
Aliás, já é sabido que os nossos Ofícios
têm uma estrutura precisa e que cada Hora do
mesmo tem um carácter próprio que deve ser
respeitado. Os salmos de Matinas têm uma
tonalidade diferente daquelas que têm os
salmos de Laudes e Vésperas. Para mais, os
salmos das Matinas devem seguir a ordem
numeral, o que exclui para os Nocturnos toda
outra composição guiadas por critérios
puramente lógicos ou devocionais. (Todavia,
isso tem a vantagem de manter melhor o ritmo
bíblico e o seu mistério).
Voltando à composição do novo Ofício,
foi necessário fazer uma selecção de salmos que
poderiam ser empregados e uma série de
antífonas aptas para os mesmos. Se existia um
salmo com antífona apropriada ao novo
intento, dar-se-lhe-ia a preferência.
Sobre tudo, se procurou uma certa
unidade para todo o novo Ofício, mas esta
procedia da inspiração; porque se tratava de
“criar” um Ofício de Monges.
Mais ainda; a nossa tarefa principal foi
comunicar a todo o conjunto uma certa
sensibilidade cartusiana (um grupo de
beneditinos teria feito outra coisa, como. de
facto, o atesta o Ofício de Monges da Liturgia

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Monástica), e ter em conta também a
sensibilidade do nosso tempo actual.
O estudo acurado dos nossos antigos
Ofícios nos revelou, a respeito do concernente
à selecção dos testos, a diferença existente
entre a sensibilidade do medievo e a nossa.
Naqueles há uma grande preponderância do A.
T., textos morais e sapienciais, que as pessoas
daquele tempo interpretavam muito
naturalmente segundo o sentido acomodatício;
ora, para os espíritos modernos, tal
interpretação pareceria um pouco forçada.
Para aqueles, porém, os textos do A. T. falavam
todos directamente de Cristo e da Igreja em
sentido anagógico ou místico. Ao presente,
somos mais críticos (o qual não quer dizer que
sejamos melhores!), e sentimos a necessidade
de textos que nos revelem mais claramente as
riquezas do Mistério de Cristo e, em
consequência, mais textos no N.T.
Por outra parte, o Vaticano II insistiu em
que o Mistério Pascal fosse colocado mais em
relevo, por ser o centro da nossa fé. Foi por isto
que intentamos colocar esse Mistério de modo
especial no III Nocturno das Matinas. Por ser o
centro, todo o que precede prepara para o
mesmo e tudo o que segue é como uma
consequência. Isto fica directamente
evidenciado pelos textos do N. T.: os de São
Paulo revelam as suas dimensões universais e os
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de S. João são interiorizações em comunhão
com a SS. Trindade.
A escolha dos textos estava influenciada
pela ideia que nos tínhamos feito do “monge”.
Que é um monge? Mantivemos uma longa
reflexão sobre este tema, imposta pela
elaboração do Lecionário e dos diversos
formulários das missas para os Santos Monges.
Os temas então examinados voltavam a
integrar-se nos textos do Ofício com o qual se
assegurava a unidade do conjunto: amor total,
chamada - resposta. Busca de Deus. Deserto.
Oração. Vida fraterna. Retorno ao Pai, por
Cristo, no Espírito Santo. Estes foram os
aspectos escolhidos da Vida monástica.
Textos importantes do Lecionário foram
tomados para o Ofício: Dt. 6 para o II
Nocturno; Gn 12 (Abraão) para o I Nocturno; as
Bem-aventuranças, etc.
Vale a pena lembrar aqui o esquema das
leituras que nos apresenta o Missal Cartusiano
para os diversos formulários para as Missas dos
Monges:
O monge está consagrado ao amor total
de Deus. Chamado por Deus a sair da sua terra
e de tudo o que não é Deus (I), desprendido,
com um coração puro e humilde, procura Deus
(II). Seguindo Jesus através do deserto,
participa nos seus combates, na sua solidão, na
sua alegria (III). Como Jesus, o monge nunca
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está sozinho: dia e noite vive em íntima relação
com o Pai (IV). Vivendo na Igreja, está unido a
todos os homens, seus irmãos, a quem assume
na sua oração e a quem ama na sua
Comunidade (V). A sua vida real é uma vida
escondida com Cristo. Iluminados os olhos do
seu coração, transfigura-se à imagem de Cristo
a quem contempla sem cessar. O Espírito
dirige-o e todas as coisas com ele, para uma
íntima comunhão de amor com o Pai e o Filho,
no segredo da Santíssima Trindade (VI).

Deve-se ter em conta que um “Ofício”


não é uma dissertação lógica, senão uma obra
cristã de arte sobre um modo de celebração
litúrgica e de contemplação. É preciso
empregar, não só a inteligência, mas também o
coração e a nossa sensibilidade. Foi, pois, com
espírito de oração e sem termos um plano
rígido determinado, mas contemplando um
certo objectivo, que empregamos os elementos
de que dispúnhamos para os enxamblar, aos
poucos, e com retoques sucessivos, ensaios e
erros que se procedeu.

O resultado tem sido uma obra que


escapa das mãos do artista e que já lhe não
pertence. Cada um pode interpretá-la e vê-la
como melhor lhe parecer. As riquezas dos
textos utilizados ultrapassa infinitamente as
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razões pelas quais foram escolhidos. Todavia,
pode existir um certo interesse em
compreender a óptica dos seus compositores.
Sobre este particular basta dizer só que a
estrutura que acabamos de expor, e que existe
realmente, tem sido percebida depois de
realizada.

Movimento geral do Ofício.

Para uma melhor compreensão do


trabalho realizado, apresentamos este resumo
sintético do movimento geral do Ofício. Os
temas do Missal vão à cabeça, pois logo
voltarão a encontrar-se articulados doutro
modo ao longo do Ofício.
No centro do mesmo está o Mistério
Pascal: nosso retorno ao Pai, por Cristo, no
Espírito Santo. As Primeiras Vésperas e os dois
primeiros Nocturnos fazem-nos caminhar para
esse encontro com Deus, em Cristo. Os Laudes,
Horas Menores e as Segundas Vésperas
derramam sobre nós as suas riquezas. A Missa,
reactualização da oferenda de amor de Cristo
ao Pai, permite-nos entrar directamente no
Mistério Pascal e tomar parte nele. »

(Dom Cyril Pierce. Conferences du


Noviciat. 124e Conference).

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Nos quadros seguintes podemos
contemplar mais de perto o conteúdo de cada
formulário e de cada Hora do Ofício.

A - Resposta à B - No deserto.
chamada de Deus. “Dominus
“Factus est”. illuminatio mea”.

Lecionário

Gradual

D – Comunhão
C -Vida de Oração. fraterna.
“Sicut oculi”. “Deus in loco”

E – T.P.
Busca de Deus.
“Exaudi, Domine”.

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O OFÍCIO DOS MONGES

1as. VÉSPERAS

Hino “Servo de Deus” dos Mártires.


Vigilância - Espera- Oração.

MATINAS

I. Noturno : Busca de Deus e Resposta.

Esperança.
Confiança. Abraão.
Oração. Sai da sua terra
Adoração. Peregrino de Deus.
Gosto de Deus.

II. Noturno: Subida para Deus através do


deserto.
Sede de Deus.
Seguimento. (Elias.
Pobreza. Refeição
Iluminação divina Eucaristia)
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III. Noturno

MISTÉRIO PASCAL

O encontro de dois amores.


“O Pai, tanto amou o mundo, que lhe entregou
o Seu Filho único, para que todo o homem que
acredite n’Ele tenha a vida eterna”.

Recapitulação do universo em Cristo.


Jesus Cristo:
Bem-aventuranças Louvor Glória.

LAUDES

Canto das Bem-aventuranças


segundo o Evangelho:
Pobres, puros, pacíficos, oração secreta, misericordiosos.

PRIMA SEXTA

TÉRCIA NOA

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A EUCARISTIA
A EUCARISTIA

Presença sacramental de Cristo na sua


oferenda de amor ao Pai no Espírito Santo,
atraindo-nos para o Seu mistério:
santa Comunhão.

II. VÉSPERAS

“Que eles sejam um, como Nós somos Um”.


Comunhão de amor e de vida.

Oração de Jesus pelo cumprimento do Seu amor


em nós. Fé em Jesus, fecunda em obras de luz:
adorar só a Deus. “Pedi e recebereis, para que a
vossa alegria seja perfeita: porque o Pai ama-
vos, porque vós me tendes amado”.

Informados com esta visão sinóptica do Ofício,


vamos entrar agora, com a ajuda de Deus, na
sua Exposião ou Explicação.

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O OFÍCIO DE SÃO BRUNO

COMENTADO POR SÃO BRUNO

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NOTICIA IMPORTANTE

Para a realização do trabalho que segue temos


aproveitado, propositadamente, a “Expositio in
Salmos” do N.P. S. Bruno. Esta Expositio, que é um
Comentário, em adiante será mencionada nestas
páginas com esta sigla: Com. E como este trabalho foi
pensado em favor dos noviços, permita-se-nos, em
atenção aos mesmos, esta breve “notícia”.
Um ms. do mesmo, do s. XII, provindo da Grande
Cartuxa, conserva-se na Biblioteca de Grenoble com o
nº. 240. A edição impressa que temos empregado foi
feita pela Ordem no ano 1891, na tipografia da
Cartuxa de Santa Maria de Pratis e por mandato do
Rvdo. P. Fr. Anselmo Maria.
Sobre o valor do mesmo, eis o sentir que formula
Dom Rivet, na “Histoire Littéraire de la France”, IX,
p.245-246: “Quem se tomar o trabalho de ler este
Comentário, estará de acordo em afirmar que será
muito difícil encontrar um escrito deste género, que
seja ao mesmo tempo mais sólido, luminoso, conciso e
claro. Se este tivesse sido mais conhecido, com certeza
que teria sido mais empregado e não tão descurado
como até o presente. Através da sua leitura, logo se
percebe um Autor instruído em todas as Ciências e
cheio do espírito de Deus; era assim que nós tínhamos
imaginado S. Bruno, segundo aqueles que o tinham
conhecido melhor… É um ótimo Comentário”.
(Aux Sources de la Vie Cartusienne, t. 1. p. 395).

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Porém, o principal motivo pelo qual temos
empregado este Comentário de nosso Pai é porque
nele aparece luminoso este aspeto da sua vida interior:
Cristo ocupa no seu coração o lugar de preferência e,
por isso mesmo, aparece naturalmente em todos seus
comentários; tudo nos salmos refere-se a Jesus e a Ele
volta sem cessar.
O mencionado Dom Rivet escrevia: “S. Bruno mostra
por todas as partes Jesus Cristo, e seus membros e a
sua Igreja” (O. c. p. 245). É que, “da abundância do
coração, fala a língua” e, neste caso, também a pena do
nosso Pai. Foi assim que, combinando os sentidos
literal, histórico, anagógico e místico -um gosto muito
daquela época - descobriu e descreveu a obra de
Cristo, a sua múltipla formosura e a sua ação
permanente nas almas. Um dos Títulos Fúnebres
chamou Bruno “Namorado de Cristo”. E, realmente,
assim aparece nos Seus “Comentários.

Oxalá que também nós mereçamos esse nome.

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EXPOSIÇÃO DO OFÍCIO

Primeiras Vésperas.

Abre-se com o antigo Hino dum mártir,


“Servi Dei”. Não deve estranhar-nos esta escolha:
Primeiro, porque o Hino fala-nos do seguimento de
Cristo, que faz triunfar o Seu seguidor dos inimigos
da alma e que confere ao vencedor os bens celestes.
Razão e ocasião propícias para impetrarmos a sua
intercessão, a fim de nos vermos livres do fardo das
nossas culpas, do contágio do mal e do tédio da
vida; e para que, livres das correntes do corpo,
sejamos libertados, com o amor de Cristo, do
cárcere do mundo. Segundo, esta escolha do hino
dum mártir deve lembrar-nos que a vocação
monástica é também uma espécie de “martírio”;
com efeito, foi com esse intuito que os primeiros
monges partiram para o deserto, quando na vida
cristã vivida no mundo tinha desaperecido a
oportunidade, até então ordinária, de dar a vida por
Cristo, como testemunha do supremo amor. “Os
monges foram considerados como os herdeiros dos
mártires, porque também eles revivem o ascetismo
da Paixão de Cristo” (Colombás. O Monaquismo
primitivo, t. 2, p. 276). E os nossos Estatutos
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fazem-se eco desse sentir quando, no nº. 1 do
capítulo 3, dizem-nos:
“Os fundadores da nossa Ordem seguiram uma luz
vinda do Oriente, a daqueles antigos monges,
consagrados à solidão e à pobreza de espírito, que
povoaram os desertos numa época em que a
lembrança recente do Sangue derramado pelo Senhor
abrasava ainda os corações”.

Ant. “Tendes apertadas as cintas e as lámpadas


acesas”. Uma antífona muito monástica e cartusiana.
Monástica, porque nos fala, com palavras do Senhor,
da constante vigilância que deve manter o monge,
para estar sempre atento à vinda do seu Senhor;
cartusiana, por ser uma frase do evangelho que, desde
há séculos, temos como próprio da missa do nosso P.
S. Bruno.

A leitura breve (Is 56, 7) apresenta-nos um


resumo, dir-se-ia, da ação do Senhor na alma do nosso
Fundador. Com efeito, com as palavras de Isaias, o
Senhor revela a sua predileção de amor: “Conduzi-los-
ei ao meu monte santo; hei-de enchê-los de alegria
na minha casa de oração; os seus holocaustos e
sacrifícios serão aceites no meu altar, porque a minha

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casa será chamada “Casa de oração” para todos os
povos”.
Reparemos nos elementos contemplativo-
solitários dessas frases: solidão no monte, alegria na
vida de oração, aceitação divina do nosso holocausto
pessoal e dos sacrifícios pela salvação do mundo e,
enfim, a oração como caraterística essencial da
dedicação monástica.
O R/M. insiste sobre a importância da atenta,
constante e vigilante espera da vinda do Senhor e da
sua recompensa imediata: o servo fiel será colocado à
frente dos bens do seu Senhor. Mais ainda, como diz o
V/., receberá a bênção do Senhor e a misericórdia do
seu Salvador.
A antífona do Magnificat é o aviso do Senhor a
respeito do nosso “propósito”: “Estai preparados como
os servos que esperam a vinda do seu senhor, quando
voltar da boda”.
Na oração destas primeiras Vésperas suplicamos a
Deus que, assim como escolheu N. P. S. Bruno para
dar aos homens um modelo de como se deve procurar
o Ùnico necesssário, nos conceda a nós, que seguimos
as suas pegadas, a graça de sermos testemunhas vivas
da Sua Majestade e união fraterna em Cristo.

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Matinas.

Invitatório. “Procuremos a Face do Senhor e


alegremo-lO com salmos jubilosos” (Sl 94. 2).

O Invitatório é, realmente, um convite para


intensificarmos a vivência da nossa vocação:
buscarmos Deus, quer dizer, vivermos para Ele; e é
tâo grande o dom dessa vocação, que devemos exultar
de alegria e manifestá-la com o nosso canto. Nosso pai
S. Bruno interpreta assim esse versículo: “Não só
devemos jubilar de todo o coração, mas tamém
perseverar na busca da Sua Face com o louvor da nossa
boca; quer dizer, sejamos semelhantes aos servos que
estão pendentes da face do seu senhor, para que este
veja a sua dedicação” (Comentário (em adiante Com.)
ao Sl. 94, 2. p. 427).

I. Noturno.
Nas antífonas deste Noturno podemos ver outras
tantas lembranças do processo da nossa entrega ao
Senhor. Assim:
1ª. Ant. “Estai preparados como os homens que
esperam pelo seu senhor, quando voltar das núpcias”
(Lc 12. 36).
Lembramos aqui a primeira tarefa da nossa vocação:
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esperar a vinda do nosso Senhor, a cuja chamada
respondemos, através da vivência da nossa vocação
pessoal, pelo caminho traçado por Bruno. Por isso
cantamos o Sl 15, o mesmo que recitamos no dia da
nossa primeira profissão. É que Deus “nos deu a
conhecer os caminhos da vida (neste mundo), e
encher-nos-á de alegria com a contemplação da Sua
Face”. N. P. S. Bruno escreve sobre essas palavras:
“Para os obedientes, os preceitos do Senhor são os
caminhos da vida…E Deus, não só não os abandonará,
antes enchê-los-á, com a Sua presença, da suprema
alegria, na contemplação do Seu Rosto” (Com. p.46).
Com razão cantaremos: “O meu coração alegra-se
com a minha sorte; tenho sempre o Senhor diante dos
meus olhos; o meu coração alegra-se e a minha alma
exulta; na Vossa direita encontraremos as delícias
eternas”.

2ª. Ant. “O Senhor é meu pastor, nada me falta. Em


verdes prados me faz descansar”( Sl 22. 1).
Recordamos que somos ovelhas de Cristo e que este
nosso Pastor é quem nos guia pelos caminhos, não
sempre fáceis, da vida monástica; daí a nossa
confissão: “Ele me guia, nada me faltará no lugar de
veras fértil em que me colocou”. S. Bruno pensa nas
pastagens das Escrituras com que Deus alimenta as
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almas e diz-nos: “O Senhor leva-me e guia-me para
um lugar ubérrimo; Ele é o meu Pastor para eu me
não extraviar nas divinas Escrituras, que são o lugar
em que as almas fiéis são alimentadas com a doçura da
sua doutrina. E, verdadeiramenete, nada me faltará
nesses verdes prados” (Com. p.78).

3ª. Ant. “Os meus olhos estão sempre postos no


Senhor” (Sl 24.15).
Esta antífona faz-nos pensar nesta verdade: Se o
Senhor me escolheu, me guia e vela assim por mim,
nada melhor do que ter sempre fitos os meus olhos no
seu querer. N. P. S. Bruno explica-nos qual é esse
olhar fito sempre no Senhor: “Os meus olhos são os
meus afetos, com os quais contemplo sempre o meu
Senhor; quer dizer, para que ele seja sempre o meu
Protetor, jamais a fasto d’Ele esses meus olhos” (Com.
p.84).

4ª.Ant.“Creio poder contemplar a bondade do


Senhor na terra dos vivos” (Sl 26. 13).
Com o poderoso e fiel Protetor, que acabamos de
mencionar, esperamos chegar à meta do nosso santo
propósito, que a gora expressamos com as palavras do
salmista.

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Qual essa bondade? São Bruno no-la revela: “Espero
que ei-de contemplar os bens do Senhor, isto é, a Sua
face e querer, pois esses sãos os verdadeiros bens; e
isto não nesta terra presente em que moramos, senão
na “terra dos vivos”, ou seja, no Paraíso, onde
ninguém habitará se não for para sempre” (Com. p.
91).

5ª. Ant. “Oferecei ao Senhor, ó filhos de Deus; adorai


o Senhor na Sua santa morada” (Sl 28. 1).
Mas enquanto durar a nossa caminhada para essa terra
dos vivos, a nossa principal ocupação é para nosso Pai
e Senhor; por isso somos convidados para Lhe
oferecermos o tributo do nosso amor e adoração.
Nosso Pai e Fundador, “exímio intérprete da
Escritura”, ajuda-nos dizendo: “Ó filhos de Deus,
oferecei-vos vós mesmos ao Senhor como o fizeram os
apóstolos”, pois esta é a oblação que Lhe dá maior
glória, “e adorai o Senhor venerando-O com as vossas
boas obras, na sua santa morada, quer dizer, no santo
átrio dos vossos afetos; átrio não estreito e pequeno,
mas dilatado pela caridade;…com esta sereis para Ele
uma amplíssima morada” (Com p. 95).

6ª. Ant. “Saboreai e vede como é doce o Senhor: feliz


o homem que nele se refugia” (Sl 33. 9).
31
E se nossas almas estiverem dilatadas pelo amor,
temos já em nós a principal condição para
experimentar o que cantámos. S. Bruno, vendo a
Jesus Cristo no “Angelus Domini” do verso anterior,
comenta assim o versículo que nos serve de antífona:
“Saboreai o Corpo e o Sangue do Senhor, pois Ele
disse: “Quem me come, viverá por mim”; e gostando
esse Corpo e Sangue, vede, ou seja, conhecei por vós
mesmos, pela experiência que vos tornará felizes no
futuro, como é bom o Senhor que comeis como
alimento e deleitável para os seus fiéis. Entretanto,
esperai que O vereis, porque é feliz o homem que
espera n’Ele” (Com. p. 117).

V. “A minha alma tem sede do Deus vivo.


R. Quando virei e aparecerei ante a Face de Deus?”

O V deste Noturno parece ser um eco prolongado até


nós, do maior desejo da alma do N. Pai Fundador:
“”Com todo o meu ser, - exclama - tenho sede do
Deus forte, do Deus vivo!” É que, “ante esse Bem de
incomparável fulgor, esplendor e formosura, a alma
santa abrassa-se no fogo do amor de Deus e não pode
menos de apropriar-se as palavras do salmista: “Tenho
sede do Deus vivo!” (Carta a Raúl)

32
RR. MM.
Nos RR. MM deste I Noturno, continuamos a ver o
processo vocacional da nossa existência monástica
entregue a Deus.

1º. R. “O Senhor falou a abraão dizendo-lhe: Sai da


tua terra e da tua família, e vai para a terra que eu te
mostrarei; e farei de ti uma grande nação. V.
Abençoar-te-ei e engrandecerei o teu nome e serás
abençoado” (Gen 12. 2).

A figura de Abraão é alecionadora para o monge.


Faz-nos lembrar a nossa chamada inicial que, como a
de Abraão, foi uma graça singular de Deus, e que só
tem explicação no Seu amor. Só Ele nos deu forças
para deixar a nossa terra, nossos parentes, amigos e
conhecidos, e irmos para um lugar desconhecido.
Aplicado isto a N.P. S. Bruno, podemos ver também
realizada nele a promessa de Deus: Foi abençoado por
Deus, deu-lhe uma família numerosa, e fez com que
fosse abençoada a sua memória na Igreja de Deus. Em
S. Bruno, participamos dessa escolha, vocação, amor,
bênção e família; correspondamos como ele, com toda
a generosidade do nosso coração.

33
2º.R. “O Senhor está à minha direita e jamais
vacilarei.Por isso, o meu coração alegra-se e a
minha língua exulta” (Sl 15. 8-9).

Este R. tirado do salmo 15 empregado no momento


da nossa primeira Profissão, permite-nos ver o
segredo da nossa perseverança na vocação
gratuitamente recebida: Tudo é graça do Deus! N. P.
S. Bruno explica-nos: “Ao presente, na tribulação, o
Senhor está à minha direita, quer dizer, vem no meu
auxílio para que eu não me afaste do meu propósito. E
por isto me alegro de todo o coração e a minha língua
canta de alegria e exultação” (Com. p. 46). E, a
seguir, cantamos a beleza e grandeza da nossa sorte: O
Senhor é o nosso único bem, nossa herança e nosso
cálice. S. Bruno coloca na boca de Jesus estas palavras:
“Os santos são a minha herança, porque os formo; e o
meu cálice, porque Me enchem de alegria com a sua
vida santa; e assim são como um cálice de óptimo
vinho que delicia e enche de alegria o coração” (Com.
p. 45).

3º. R. “Senhor, me ensinastes os caminhos da vida.


Encher-me-ás de alegria com a Vossa presença
(Sl 15. 11).

34
O Senhor nos escolheu para Si e Ele próprio vai
descobrindo-nos os caminhos da vida abraçada e da
vida divina que cresce em nós. E aí está a fonte da
nossa alegria: andarmos sempre na presença do
Amado do nosso coração, e em sabermos que os Seus
deleites não têm fim: O nosso destino está nas Suas
mãos! Nosso Pai escreve: “Quando estiver no Céu, na
divina presença, então experimentarei toda a
veemência da alegria. É que o Senhor coloca a Sua dita
em pôr à sua direita aqueles que Lhe foram entregues”
(Com. p. 46).

4º. R. “Meu Auxiliador, Vós hei-de cantar, porque


sois meu Deus salvador. Meu Deus e a minha
misericórdia”. V. Cantarei o vosso poder e
exaltarei a Vossa misericórdia desde o
amanhecer. (Sl 58. 18.17).

Sim, o Senhor é a nossa fortaleza: por Ele temos


chegados vitoriosos até agora; temos experimentado a
Sua misericórdia sobre nós. É, pois, com razão, que
podemos cantar o Seu poder e alegrar-nos com a Sua
bondade. N. P. S. Bruno comenta: “Cantar-Te-ei,
Senhor, pela tua misericórdia e fortaleza; e cantarei,
não só com a boca e a devoção, mas também
honrando-te com a minha vida; e porque Tu és o meu
35
Auxiliador, não me cansarei de exaltar a tua
misericórdia” (Com. p. 235)

II. Noturno.
As antífonas e RR/MM. deste Noturno
permitem-nos ver os efeitos que causa na alma do
monge a vocação generosamente vivida na
simplicidade e integridade do amor. Se a alma se
entregar a Deus, “que a procurou o primeiro para a
unir a Si por íntimo amor” (Est. 1. 1), com a
integridade do seu amor, esse Deus, que Se não deixa
vencer em generosidade, entrega-Se à alma deixando
atuar nela os Seus dons e graças. Vamos vê-lo
seguindo, sempre que possível, a doutrina de N.P. S.
Bruno.

1ª. Ant. “Tirareis com gozo das fontes do Salvador”


(Is 3. 12).
Esta antífona, tirada de Isaías, lembra-nos as
vantagens que nos proporciona a nossa vocação em
ordem às graças divinas: permite-nos viver na
intimidade com Deus, em união de amor; abre-nos as
fontes da graça, “as fontes do Salvador”, onde
podemos aurir com alegria “aquelas águas que saltam
até a vida eterna” (Jo. 4. 14). É por essas águas que a
alma do monge suspira e para elas corre, como o
36
veado pelas fontes. Ouçamos N.P: S. Bruno: “Depois
de me ter consumido e aniquilado nos vícios, Senhor,
a minha alma suspira e tende para Vós, Sumo Bem, tal
como o veado pelas correntes das águas; e diz
“correntes das águas”, para indicar aquelas águas
inesgotáveis, que sempre correm e nunca se esgotam.
O veado, quando mordido pela serpente, corre para a
fonte viva onde as águas nunca faltam, com todo o
ardor das suas forças extenuadas; corre para se
dessedentar e reavivar a sua juventude. Do mesmo
modo, todo o fiel, afetado pelo veneno do vício, corre
para Cristo, fonte de vida indeficiente, através das
boas obras e da paciência nas tribulações; e quando
chega até Ele, deposto o velho homem carnal, fica
renovado numa inefável juventude, dessedentando-se
e refrigerando-se nas águas dessa Fonte; por isso se diz
no Apocalipse: “Eu renovo todas as coisas” (21. 5)
(Com. p. 153).

2ª. Ant.” Ó meu Deus, alegria do meu rosto”


(Sl 42. 5).
Se Jesus é para o monge “fonte de vida”, é também
fonte de salvação e alegria. Sim, a vida monástica não
é um mar de rosas, nem foi procurando delícias que o
monge decidiu seguir Cristo e levar a sua cruz. E
como o seu Mestre, deverá experimentar em si o seu
37
peso através de tentações do inimigo, de tristezas
inexplicáveis, de trevas, de aflições. Mas conta sempre
com a atenção e a benevolência do seu Senhor: Ele é a
sua salvação, a linda luz do seu rosto e do seu
caminhar.
N.P. S. Bruno adverte-nos: “Cristo é a nossa luz
segundo a sua Divindade e a nossa verdade segundo a
sua Humanidade; e tira-nos do vale do erro e leva-nos
para o seu monte santo, para o seu tabernáculo: para o
monte onde estão os perfeitos soldados na altura das
virtudes, com as quais lutam contra os pecados…Ele é
quem nos leva ao altar de Deus, quer dizer, para o
conhecimento e contemplação da Divindade (Com. p.
158).

3ª. Ant. “Felizes os que mora na vossa casa, Senhor,


louvar-Vos-ão por todos os séculos” (Sl 83. 5).
Viver com Deus, viver para Deus, servir a Deus, eis o
verdadeiro ideal do monge. E se ama tanto o seu
mosteiro é porque o considera como Casa e Templo,
como Altar e Ninho, como Lugar de encontro e
Mansão da posse. Esta felicidade é cantada por este
salmo que, com toda a razão, foi chamado “o salmo
dos consagrados”. E é aí onde o monge tem a
facilidade e a felicidade de se ir preparando para a

38
eterna mansão, onde amará e louvará a Deus para
sempre.
“Mas, escreve S. Bruno, somente chegará à posse
dessa eterna felicidade aquele que se disponha de todo
o coração a subir para ela, através de muitas ascensões
na virtude e das boas obras; para isso recebe o auxílio
da graça porque, por si próprio, ninguém pode subir”
(Com. p. 377).

4ª. Ant. “Vós sois bom, ó Senhor, e indulgente, cheio


de misericórdia para todos os que Vos
invocam” (Sl 85. 5.
Esta antífona, aliás como todo o salmo, colocam-nos
perante a radical indigência natural do nosso ser:
cristãos e monges, precisamos constantemente do
auxílio do Senhor para realizarmos a nossa vocação,
para levarmos a cabo aquelas “ascensões que, de
sincero coração, propomos realizar neste vale de
lágrimas”, segundo o salmo antes cantado. Mas Aquele
que nos chamou, não nos abandona nem nos deixa a
sós em nenhuma circunstância da nossa vida e
trabalho. E essa bondade e assistência do Senhor
cantamo-las nesta antífona, confessando que Ele é
“bom e indulgente, cheio de misericórdia para com
todos os que O invocam”. N.P: S. Bruno coloca na
boca do Salvador essas palavras deste modo: “Ó Pai,
39
Vós sois suave, ou seja, amável e agradável alimento
para os homens santos, embora como pecadores
estejam muito longe de Mim; e sois indulgente com os
pecadores ainda não penitentes, não os condenando
logo, mas esperando-os com paciência e perdoando
com infinita misericórdia a quantos Vos invocam com
amor, implorando a remissão das suas culpas” (Com.
p. 384).

5ª. Ant. “A luz brilha para o justo e a alegria para os


retos de coração” (Sl 96. 11).
Essa iluminação é um imenso favor que Deus concede
a seu monge e que, por ser divina, é a fonte da mais
pura alegria, que ninguém poderá arrebatar” (Jo 16,
22). N. P: S. Bruno considera os trabalhos e aflições
que todo o servo de Deus deverá experimentar neste
mundo, e adverte-nos: “Mesmo que venha a perder
todas as coisas deste mundo e inclusive a própria vida,
se não deve preocupar com isso; porque, por essa
perda, ser-lhe-á dada a luz da vida eterna, quer dizer,
a vida indeficiente com a luz da divina contemplação;
e pelas tristezas que tiver padecido neste mundo, terá
no futuro a alegria da eterna bem-aventurança. Por
tanto, sendo Deus a luz e a alegria para o justo, não se
deve deixar vencer nem se contristar pelas tribulações

40
da vida, antes se alegrar no seu Senhor” (Com. p.
436).

6ª. Ant. “Aclamai o Senhor, terra inteira” (Sl 97. 4).


Perante esses benefícios divinos que nos vêm pela
vocação monástica e lembrados com as precedentes
antífonas, esta última quer ser um convite a todas as
criaturas para que nos acompanhem em agradecer a
Deus esses dons, cantando connosco os divinos
louvores. Por isso exclamamos: “Exulta de alegria e
aclama ao Senhor, terra inteira” (Ant.). São Bruno, ao
comentar este verso, contempla o benefício da
redenção de Cristo, pela qual nos vieram todos os
bens, e escreve assim: “Cristo, com o poder de Deus,
salvou todo o género humano e foi revelado aos
judeus e aos gentios; perante isso, exultai de alegria
em Cristo, o Senhor, com um intenso afeto e
devoção, todos os moradores d a terra” (Com, p.
437).

V. “Procurai Deus,
R. E a vossa alma viverá” (Sl 68. 32).

O V. lembra-nos em poucas palavras a tarefa principal


da vida monástica: procurar Deus. É a primeira
disposição que deve ter quem deseja ser monge (cf.
41
Est. 8.6). E o R. indica-nos o efeito imediato dessa
procura: a vida para a alma. N.P. fundador adverte
sobre esse versículo: “Todos os fiéis são exortados
para ver e alegrar-se e buscar o Senhor… Porém, não
basta ver para serem humildes; nem se alegrarem com
a salvação prometida; é preciso procurar o Senhor
praticando o bem; e só com isso a vossa alma viverá e
alegrar-se-á na vida eterna” (Com. p. 290).

RR. MM.
5º. R. “Elias olhou e viu junto à sua cabeça um pão cozido
debaixo da cinza e, levantando-se, comeu e bebeu; e com a
força desse alimento, caminhou até o monte de Deus.”
V. Se alguém comer deste pão, viverá eternamente” (Jo 6.
52).
Contemplamos a pessoa de Elias: fortificado pelo alimento
que lhe proporciona o Anjo, caminha pelo deserto até a
montanha de Deus. Esse alimento é uma figura de
Eucaristia, viático do nosso êxodo.
Não devemos cair no erro de minimizar o trabalho que
implica “a procura de Deus”, para termos em abundância a
vida de Deus e com Deus; todo o trabalho continuado e com
ardor esgota as forças. Então, onde encontrarmos as
suficientes energias para levarmos a cabo a nossa procura de
Deus, no deserto cartusiano?

42
Este R. indica-nos o pão e a água para nossa
caminhada: Cristo, o “Pão vivo” e a “Fonte de águas
vivas”, comunicar-nos-á com a sua Eucaristia a
fortaleza necessária para caminharmos sem parar até o
Monte de Deus. E o V. dá-nos uma segurança
absoluta disso: “Quem comer deste Pão, viverá
eternamente” (Jo 6,51).

6º. R. “Amar-te-ei, Senhor, minha fortaleza, refúgio e


abrigo” (Sl 17.2-3).
Perante a fineza e grandeza desse amor de Jesus,
que Se torna “viático” da nossa peregrinação, só cabe
uma resposta da parte do monge: amar a esse Senhor
com todas as forças e sobre todas as coisas. Que
menos retribuir a quem Se nos dá como Força,
Refúgio, Libertador, Salvador e Defensor? Aqui
podemos apropriar-nos as palavras de N.P. S. Bruno.
“Amar-Te-ei antes da morte, e depois da morte só me
restará amar-Te por toda a eternidade. Para os santos,
recebida a imortalidade, nada lhes restará fazer na vida
futura senão amar…, porque a caridade nunca
desaparecerá” (Com. p.52-53).

7º. R. “O Senhor assentou os meus pés sobre a rocha


e dirigiu os meus passos e pôs nos meus
lábios um cântico novo”(Sl 39. 3-4).
43
Neste R. sálmico cantamos a nossa dita vocacional:
o Senhor assentou os nossos pés na rocha; encaminhou
os nossos passos; ensina-nos um cântico novo para a
vida nova e retirou-nos do lamaçal da culpa e, como se
tudo isso fosse pouco, ouve sempre o nosso clamor.
Nosso P. Fundador dá-nos esta explicação:
“Estabeleceu os meus pés, quer dizer, as minhas
afeições, sobre a firmeza da rocha, ou seja, sobre a
estabilidade das virtudes, e dirigiu-as para que
permanecessem estáveis na prática do bem; e inspirou
ao meu coração um cântico novo, um novo louvor,
digno d’Ele…E ouviu as minhas preces e, para me
tornar digno de ser ouvido, começou por me tirar do
abismo dos vícios em que tantos outros caem
miseravelmente” (Com. p. 145).

8º. R/. “Os meus lábios gozarão ao cantar-Vos, e


também a alma que remiste, Senhor” (Sl 70.
23).
Tendo experimentado em si mesmo a incansável
misericórdia de Deus, o monge não pode menos de
Lhe manifestar a sua gratidão; e fá-lo agora cantando a
sua glória com o corpo e com a alma, com os sentidos
e as potências: os meus lábios exultam de alegria e a
alma que resgatastes; e a minha língua celebrará a
vossa justiça. N. P. deixou-nos este comentário: “Os
44
afetos da alma são chamados lábios, porque por eles a
alma fiel fala interiormente consigo mesma e louva a
Deus, e medita na Sua justiça, e exulta pela redenção
recebida” (Com. p. 299).

III. Noturno.
Ant. “Deus amou de tal modo o mundo, que lhe
entregou seu filho Unigénito, para que todo
aquele que acreditar n’Ele não pereça, antes
tenha a vida eterna (Jo 3. 16).
Esta antífona revela-nos o segredo essencial da nossa
vocação em Cristo: O puro amor de Deus, que nos
deu Seu Filho Único, para que todo aquele que
acreditar nele tenha a vida eterna e não pereça. Ora,
nesse amor essencial e eterno, está contido o amor
vocacional, quer dizer, essa predileção divina, essa
prova de amor que Ele nos dá gratuitamente
chamando-nos “para nos unir a Si por íntimo amor” e
“estarmos sempre com Ele” na solidão (Est. 1. 1).
Colocados nessa onda, não nos admire que cantemos a
seguir três “Cânticos de amor”.

1º. Cânt. O primeiro é a célebre “Shemá” de Israel:


uma profissão de fé no Deus único, que tanto amou
Israel e a Quem todo israelita deve amar de todo o
coração, com toda a alma e com todas as suas forças,
45
É fácil imaginar por que foi escolhido este Cântico
para o Ofício dos Monges: a vocação monástica é uma
vocação de amor e que só com muito amor, com um
amor sem limites, se pode realizar.

2º. Cânt. (Ef 1, 3-10). Este é um cântico admirável a


Deus nosso Salvador, Pai de Jesus Cristo: N’Ele nos
escolheu antes da criação do mundo, para sermos e
imaculados na sua presença, pelo amor. Com este
Cântico queremos agradecer a Deus o dom inefável da
nossa vocação cristã, com o qual nos mostrou a Sua
dileção a nosso respeito; e o dom não menos
admirável da vocação monástica, com o qual
queremos viver em plenitude o nosso ser cristão.

3º.Cânt. (Ap 15, 3-4). Este é um Cântico de


adoração. O que pode fazer o pobre monge que
experimentou em si a grandeza do amor e do
chamamento divino, senão prostrar-se em profunda
adoração ante esse Pai, Deus e Senhor, e glorificar o
Seu Santo Nome? Amar, contemplar e adorar será a
nossa eterna ocupação no Céu, cuja aprendizagem
estamos a praticar neste mundo.

V. “Para mim, o bom é aderir-me ao Senhor.


R. E colocar nele a minha esperança” (Sl 72. 28).
46
Neste versículo e na sua reposta temos uma bela
confissão da nossa vocação de amor. Sim, a tarefa do
monge, toda a sua dita está em permanecer sempre
unido a Deus e em colocar n’Ele toda a sua esperança.
N. P. S. Bruno escreve: “Para mim, o bem, quer
dizer, o útil é unir-me a Vós, meu Deus, com todo o
meu pensamento, e colocar em Vós, Criador de tudo,
a minha esperança, quer dizer, todo o meu desejo.
Equivale a dizer: Senhor, não me perderás, porque o
único que considero útil nesta vida é pensar em Vós e
só a Vós desejar”(Com. p. 313).

RR/MM.
Os RR. deste III Noturno colocam diante de nós a
tarefa do nosso propósito monástico: a incessante
vigilância que o monge deve manter, para esperar
atento a vinda do seu Senhor e recebê-lo com as
lâmpadas acesas. E esta espera vigilante é tanto mais
urgente e obrigatória, porquanto que não sabemos a
hora em que o Senhor virá (9º R); o fruto que, já
nesta vida, é dado ao monge fiel (10º R); a ocupação
preferida de quem encontrou o Senhor e vive com ele
(11º. R) e a recompensa que Deus dá ao Seu servo fiel
(12º. R). Vejamos.

47
9º. R. “Estejam cingidos os vossos rins e acesas as
vossas lâmpadas. Sede semelhantes aos homens
que esperam o seu Senhor, ao voltar das
núpcias”. “Velai, porque não sabeis a hora em
que o Senhor há-de vir”(Lc 12. 35.40).
A atitude correta do nosso espírito está
admiravelmente traçada pelo Senhor: é vivermos
sinceramente à espera da Sua vinda; não perdermos o
tempo em vãs ocupações que nos distraiam ou
apartem dessa atenção para o objeto do nosso amor.
Se antes temos cantado: “A minha felicidade é estar
unido a Deus”, essa felicidade reclama esta atenção
vigilante ao Amado, essa total disponibilidade para
Ele, a todo o tempo.

R/. 10º. R. “Como é grande, Senhor, a abundância da


vossa doçura que tendes reservada para os que
Vos temem” (Sl 30. 20). V. “E a entregais
completa àqueles que esperam em Vós, na
presença dos homens” (Ib.).
Só vivendo intimamente unido ao Senhor,
experimentará o monge a grandeza da sua bondade, a
fineza do Seu amor. O Salmista canta-o por o ter
experimentado. N.P.S. Bruno identifica essa bondade
com a misericórdia de Deus e diz que Ele a “manifesta
àqueles que separou e escondeu da conturbação dos
48
perversos e colocou ao abrigo da sua face, longe dos
homens maus, para que não sejam perturbados com o
seu mau proceder. E escondeu-os no Seu tabernáculo,
na sua milícia ou serviço” (Com. p. 105).

11º. R. “Bendirei o Senhor em todo o tempo: o seu


louvor estará sempre nos meus lábios. V.
Glorie-se a minha alma no Senhor; ouçam os
humildes e alegrem-se” (Sl 33. 2-3).

Este R. lembra-nos, por um lado, a melhor


resposta que a alma agradecida do monge pode dar a
essa bondosa misericórdia de Deus, que tanto
experimentou na sua vida; por outro, o dever
primordial do monge, segundo o abade Moisés: “Este
deve ser o nosso principal empenho, esta a perpétua
orientação do nosso coração: que a nossa mente
permaneça sempre aderida a Deus e às coisas divinas”
(Cassiano, Collationes, 1. 8).
Com a letra do R. prometemos cumprir ambas as
coisas: bendizermos o Senhor em todo o tempo; com
a do V. publicamos diante de todos que colocamos
nessa tarefa toda a nossa alegria. Ouçamos a lição de S.
Bruno, N. Pai: “Bendirei o Senhor praticando o bem
segundo a Sua vontade; e fá-lo-ei em todo o tempo,

49
quer dizer, na prosperidade e na adversidade. E não só
O bendirei com o meu proceder, mas também o Seu
louvor estará sempre na minha boca; ou seja, louvarei
o Senhor com a boca do meu corpo e com a boca do
meu coração; e assim bendirei e louvarei o Senhor
com a minha vida reta colocada ao Seu serviço,
empregada no Seu louvor e consagrada à obediência; e
com esse bom exemplo, os humildes louvarão
também o mesmo Senhor”( Com. p. 116).

12º. R.“Põe no Senhor as tuas delícias: conceder-te-á


os desejos do teu coração. V. “Confia no Senhor
e espera nele” (Sl 36.4-5).
Se o Senhor escolheu o monge para o unir a Si em
íntimo amor (cf. Est. 1.1); se o monge consagrou-se
por amor a esse Senhor e colocou n’Ele a sua vida; se
Lhe dedicou todos os seus trabalhos e se resumiu n’Ele
toda a felicidade da sua existência, compreende-se
perfeitamente que o último R. deste Ofício lembre,
ou melhor, convide o monge a comprazer-se no seu
Deus, a viver para Ele com humildade, a colocar n’Ele
a sua confiança, certo de que Ele satisfará todos os
desejos do seu coração.
No entanto, sempre é possível que o verme da
vaidade ou da soberba intente morder o fruto duma
vida santamente vivida para Deus. Por isso nos adverte
50
nosso Fundador e Mestre: “Põe no Senhor as tuas
delícias, fazendo o bem e não o atribuindo a ti mesmo,
mas ao Senhor; isto é, colocando n’Ele o teu gozo e
prazer; se procederes assim, Ele dará satisfação
cumprida a todos os desejos do teu coração; quer
dizer, a tudo isso que desejas e esperas: os bens
eternos… Não te ensoberbeças, mas submete-te a
Deus cada vez mais; e para não desfaleceres, pede ao
Senhor para que seja Ele a justificar-te” (Com, p. 129-
130).
Evang. “Jesus disse aos seus discípulos: ‘Tende as
vossas cintas apertadas e as vossas lâmpadas
acesas. Sede como homens que esperam o seu
senhor, quando voltar do seu casamento, para,
assim que chegar e bater, lhe abrirem logo a
porta. Felizes esses servos que o senhor, ao
chegar, encontrar vigilantes. Em verdade vos
digo: cingir-se-á, mandará que se ponham à
mesa e servi-los-á. Se ele vier antes ou depois da
meia-noite e assim encontrar aqueles servos,
felizes serão eles. Ficai a sabê-lo bem: Se o dono
da casa tivesse sabido a que horas viria o ladrão
não teria deixado arrombar a sua casa. Estai vós
também preparados, porque o filho do homem
chegará na hora em que menos pensais” (Lc 12.
35-40).
51
A escolha deste evangelho para o Ofício e Missa
do N.P. S. Bruno não foi feita por nós; foi a Sagrada
Congregação que assim o determinou. E
providencialmente, dizemos nós, pois nos revela o
aspeto primordial da vocação e da atitude permanente
da alma do nosso Pai e Fundador: a total dedicação a
Deus, a vivência da mesma no amor e numa espera
vigilante e atenta à vinda do Senhor, para Lhe abrir a
porta logo que chegar e bater.
N. P. S. Bruno diz-nos sobre essa espera: “Viver
vigilando é a melhor vida que se pode desejar e
inventar pelos homens… Eu decidi velar também,
pois é o melhor modo de viver para Deus. Por isso
digo: Vigilo, ó Deus, louvando-Vos com a minha voz
e com a minha vida” (Com. p. 250).
Desnecessário é dizer que essa vela e vigilância
outra coisa não é senão a fiel e evangélica dedicação ao
“Único necessário”. Afortunadamente para nós, esse
aspecto da vida do nosso Fundador foi posto muito em
relevo pelos seus contemporâneos nalguns dos
“Títulos fúnebres”. Assim, por exemplo, a Abadia de
N. Senhora de Blois, escreve: “Bruno fixou a sua
morada no que foi o ideal da sua vida, no “único
necessário” (Tít. 17. PL. 152, 560). E na Catedral de
Laon foi consignado: “Bruno, o eremita, rejeitou
inteiramente o fardo das suas honras, para não ter
52
outro cuidado senão o amor de Cristo” (Tít. 66. o. c.
p. 573). E na célebre Abadia beneditina de São Vaast,
em Arras, deixaram este belo testemunho: “Bruno foi
luz e exemplo dum caminho que leva para as alturas
da sabedoria… Mas abandonando tudo o mudável,
fechado na clausura da tua vida penitente, aderes ao
Único necessário. Assim, ó pai, és possuidor de Deus,
sendo possuído por Ele”. (Tít. 126. o. c. p. 589).
Enfim, os monges da Abadia de Moutier la Celle
escreveram: “Ó Cristo, Verbo do Pai, concedei ao
vosso servo Bruno o Reino celeste, pois durante a sua
vida uniu-se a Vós com um coração puro” (Tít. 48. o.
c. p. 569).
Na verdade, o conteúdo dos elogios mencionados
concorda com a realidade vivida por nosso Pai e
Fundador; com efeito, ele próprio nos mostra a total
dedicação com que vivia para Deus quando nos
exorta: “Esvaziai os vossos corações de tudo o que é
vosso e não de Deus” (Com. p. 527).

A oração conclusiva das Matinas pede para nós essa


dedicação vocacional, implorando, pela intercessão do
nosso Pai, a graça de “cumprirmos fielmente os votos
que fizemos” de vivermos totalmente dedicados a
Deus, “para alcançarmos desse modo os bens que

53
Deus promete aos que perseveram em viver para Ele”
(Oração da festa).

Laudes.

E com estes desejos no fundo da alma, iniciamos


a última parte do nosso Ofício Noturno que, em
realidade, é o começo do dia litúrgico, da nossa
solenidade.
O Hino dos Laudes, aplicado a N.P. S. Bruno, é
um belo cântico a Cristo, coroa dos seus santos. Nele,
depois de termos implorado o perdão dos nossos
pecados, obstáculo principal para a comunicação da
graça divina, apresentamos os méritos e o triunfo do
santo festejado, para que nos seja outorgado pela sua
intercessão aquilo que imploramos.
Para isso, lembramos e alegamos: o desprezo das vãs
alegrias e das riquezas terrenas, e a sua dedicação aos
bens celestes; o testemunho de amor que ele deu
vencendo o inimigo e seus colaboradores, o mundo e a
carne; a prática das virtudes e o domínio do corpo
através do jejum. Por tudo isso, imploramos, pela sua
intercessão, o perdão das nossas culpas.
Este Hino é de origem ambrosiana e encontra-se
nos Breviários cistercienses, tal vez foi daí que o
tomaram os cartuxos. A sua existência está
54
confirmada, já no s. X, na Igreja de Milão. No texto
original, porém, há uma bela estrofe que falta nos
hinos posteriores. É interessante o seu conteúdo:
“Mais corre o confessor, suportando o combate, do
que o mártir que dum golpe derrama o seu sangue
pela espada”. Talvez, por essa comparação foi retirada
essa estrofe. Como é sabido, o martírio foi
considerado sempre como o supremo testemunho e a
maior prova de amor a Cristo.

As Antífonas dos Laudes apresentam-nos a


espiritualidade monástica contemplada à luz das
principais virtudes que, desde o começo, constituíram
a sua essência evangélica: pobreza de espírito, pureza
de coração, mansidão, oração, misericórdia.
Como se vê, mencionam as bem-aventuranças
evangélicas, com a inclusão da oração em segredo.
Como é sabido, o texto evangélico das mesmas veio a
ser e continua sendo a carta magna da vida do monge.
No antigo repertório noturno cartusiano, não
existiam as antífonas “Beati pacifici” e “Beati mundo
corde”. Para a primeira, tem-se escolhido a antífona
da Comunhão da festa de Todos os Santos; no segundo
caso, tem-se procurado na liturgia cisterciense. A
escolha foi afortunada em ambos casos.

55
Desnecessário é dizer que todas elas podem-se
aplicar à vida de N.P: S. Bruno e que nos trazem uma
mensagem particular para o nosso viver monástico
actual.

1ª. Ant. “Bem-aventurados os pobres em espírito,


porque deles é o Reino dos Céus” (Mt 5.3).
Eco da pobreza do N. P. Fundador pode ser este
Título da Igreja de Reims onde todos o conheciam
muito bem: “Este exímio Pai e fundador duma Ordem
religiosa mostrou-se sempre exemplar para todos seus
irmãos; ensinava-lhes a maneira de desprezar as coisas
perecedoiras deste mundo, para anelar pelos bens da
Pátria celeste. De múltiplas maneiras brilhou na nossa
cidade, onde foi favorecido pelos bens da fortuna e
possuiu riquezas; no entanto, colocou Cristo acima de
tudo, para O seguir no deserto com muitos
companheiros” (Tít.52).
E se a pobreza tem para todos os religiosos o
mesmo poder libertador, na alma de nosso Pai adquire
também uma orientação contemplativa. Ele próprio
adverte: “Deve-se abandonar todo o interesse pelos
bens materiais, para ocupar-se só com Deus por meio
da contemplação; buscá-lo com todo o amor do
coração e desejá-lo com todo o afeto” (Com. p. 529).

56
2ª. Ant. “Bem-aventurados os puros de coração,
porque verão a Deus” (Mt 5. 8).
Sabemos a importância capital que a pureza do
coração teve e tem na vida monástica, onde não
significa só a ausência dos apetites carnais, mas a
integridade dum amor entregue por completo ao
Senhor e que, por isso mesmo, evita toda a culpa
voluntária, mesmo leve, no cumprimento da vontade
de Deus. Quanto pairava no espírito de S. Bruno essa
pureza, podemos vê-lo nesta sua oração: “Senhor, dai-
me uma norma para que eu caminhe sempre bem;
quer dizer, uma lei para que nem recue nem me
extravie pela direita nem pela esquerda; porque,
quem recuar, perde a coragem; quem se desviar para a
direita, afana-se demasiado no trabalho da sua
santificação e, procedendo sem moderação, não
alcança o fim proposto…E quem se extraviar pela
esquerda relaxa-se na virtude, se não logo, sim em
breve. Quem deseja a santidade não deve descurar em
nada a prática das virtudes” (Com. p. 91). E
comentando estas palavras: “Cor mundum crea in me,
Deus”, escreve assim: “Cria em mim um coração
puro, limpo de todo o pecado e de todo o erro, para
que possa assim contemplar dentro de mim os Teus
mistérios” (Com. p. 196)

57
3ª. Anti. “Bem-aventurados os pacificadores, porque
serão chamados filhos de Deus”. (Mt 5. 9).
S. Bernardo definiu o monge como “O homem
que, vivendo em paz com Deus, pode trabalhar pela
pacificação universal”. Aliás, já sabemos como era
importante, na primitiva vida monástica, essa paz para
o monge poder realizar o seu ideal de busca e união
com Deus na vida de oração. E chamarão esse estado
de paz a “hesychía”. É que nosso Deus “é um Deus de
paz”, e só com essa paz podemos ser seus filhos e
vivermos como tais. Nosso P. S. Bruno escreveu sobre
essa paz: “O lugar de Cristo está na paz; ou seja,
naqueles que vivem em paz com Deus e com o
próximo, permanece Deus; não dum modo material,
senão espiritualmente, tal como diz S. João: “Deus é
amor e quem permanece no amor, permanece em
Deus e Deus nele” (1 Jo 4,16), porque o amor é
verdadeiramente a paz” (Com. p. 325).

4ª. Ant. “Tu, quando orares, entra no teu quarto e,


fechada a porta, reza em segredo a teu
Pai”(Mt. 6. 6).
No Ofício dos Monges, não podia faltar esta
expressa menção à oração solitária e a sós com Deus.
É que a vida do monge, segundo os Padres do
monaquismo, deve ser uma constante oração.
58
Podemos lembrar aqui as palavras que Cassiano coloca
na boca do abade Isaac: “Todo o fim do monge e toda
a perfeição do coração tende a perseverar numa
oração ininterruta, segundo o permitir a nossa
natureza” (Collationes, 9, 2). Os Estatutos fazem-se
eco dessas palavras no c. 3. n. 2. Impossível
mencionar aqui todos os textos em que nosso P. S.
Bruno fala da oração. Mencionemos, porém, só esta
passagem: “No meu coração está a oração que elevarei
a Deus, autor da minha vida, e dir-lhe-ei
interiormente: ‘Ó Deus, Vós sois o meu Médico, o
meu Senhor: por que simulais ter-Vos esquecido de
mim?” (Com. p. 156). A ausência (aparente) de Deus,
é também um modo de presença divina.

5ª. Ant. “Sede misericordiosos, como vosso Pai é


misericordioso, diz o Senhor” (Lc 6. 36).
Não é preciso indicar que a misericórdia é uma
virtude eminentemente monástica; por isso, a sua
lembrança está justificada neste Ofício. É que o
monge, ciente da incessante misericórdia que recebe
de Deus, não pode agradar a esse Deus a quem diz
amar, procurar e servir, se ele próprio não se torna
um vivo reflexo dessa paternal misericórdia do seu Pai
S. Bruno, comentando as palavras do salmo 12: “Eu,
porém, esperei na vossa misericórdia”, escreve assim:
59
“Para eu permanecer imutável, espero e esperarei, não
em mim mesmo, mas na vossa misericórdia; e porque
espero e esperarei nessa misericórdia, a minha alma
alegra-se com a vinda do meu Salvador, vosso Filho,
que me salvará” (Com. p. 39).

Leitura breve. “Hei-de conduzi-los ao meu santo


monte; hei-de enchê-los de alegria na minha casa de
oração. Os seus holocaustos e os seus sacrifícios serão
aceites no meu altar, porque a minha casa será
chamada “Casa de oração” para todos os povos” ( Is 56.
7).
A escolha desta leitura foi realmente feliz. Só ela já
nos diz toda a dita e grandeza da vocação
contemplativa cartusiana. Todas as frases escolhidas
podemos aplicá-las a nosso P. S. Bruno. Com efeito,
foi esse Deus misericordioso, em quem esperou
sempre, que o “conduziu ao monte santo” da Cartuxa;
que o “encheu de alegria na sua casa de oração”; que
“aceitou os holocaustos e sacrifícios” que Lhe
ofereceu; e que fez com que essa morada fosse
chamada “Casa de oração para todos os povos”. Já é
sabido: na vocação do nosso Pai e Fundador estava em
germe a nossa; nele, Deus viu-nos também a nós e nos
escolheu para vivermos e prolongarmos na Igreja o seu
mesmo carisma contemplativo.
60
Por outro lado, vemos mencionados também os
principais elementos da vocação cartusiana: a solidão,
a alegria, a oração e a nossa participação na Cruz de
Jesus, através do holocausto de nós mesmos e das
penitências que aceitamos por amor e para nos
conformarmos com Ele, “vir dolorum”, e sermos seus
colaboradores na redenção dos homens.

R.P. “Bendirei o Senhor em todo o tempo. V E o seu


louvor estará sempre na minha boca (Sl 33. 2).

Este R. expressa, não só a nossa “resposta” à palavra


ouvida, mas também o maior anelo do coração
contemplativo. Que outra coisa pode pensar e desejar
senão “bendizer ao Senhor em todo o tempo” e fazer
que “o seu louvor esteja sempre na sua boca”? Vejamos
como interpreta nosso Pai fundador essas palavras do
salmo: “Bendirei o Senhor louvando-O como presente
e realizando o bem na sua presença e a todo o tempo;
quer dizer, na adversidade e na prosperidade. E
bendizê-lO-ei, não só com a boa maneira de viver,
mas fazendo com que o seu louvor esteja sempre na
minha boca; ou seja, com a boca do corpo e com a
boca do meu coração; e desse modo bendirei e
louvarei o Senhor com a minha vida entregue a Deus
pelo louvor e pela obediência, e fazendo com que,
61
através do meu bom exemplo, seja louvado também
pelos homens” (Com. p. 116).
E sobre o salmo 144. 2, tem este comentário:
“Bendirei o teu Nome, ou seja, louvar-te-ei pela
consideração do teu Nome, que é “Senhor”; e
bendizer-te-ei com uma bênção que durará por todos
os séculos; porque Te louvarei com o louvor da vida
contemplativa neste século e no futuro, segundo
aquilo do Evangelho: Maria escolheu a melhor parte
que lhe não será tirada (Lc 10. 42). É que a vida ativa
só durará no mundo presente” (Com. p. 650).

Ant. para o Benedictus. “Se alguém Me ama,


guardará a minha palavra, e o meu Pai amá-lo-á, e
viremos a ele e faremos nele a nossa morada” ( Jo
14. 23).
Esta antífona interioriza a nossa alegria e comunica-
lhe firmeza e estabilidade com a maravilhosa presença
da SS. Trindade no nosso coração. Aliás, revela-nos o
grande segredo da vida cartusiana. Com efeito, se
Deus nos chamou por amor, e se por puro amor nós
respondemos ao Seu chamado (cf. E. 1. 1), é também
pelo caminho do amor que essa vocação deve ser
realizada. Quer dizer, se realmente amamos a Deus,
guardaremos a Sua palavra, cumpriremos a sua
vontade e, desse modo, seremos objeto das suas
62
complacências; e o fruto das mesmas em nós será a
íntima união com Deus: “faremos morada nele”. E essa
morada, união com Deus no tempo presente, é a que
lavra a eterna união que nos espera na Pátria. Nosso
Pai fundador diz-nos: “Os santos, recebida a
imortalidade, nada terão para fazer no Céu senão
amar, em conformidade com a palavra do Apóstolo:
‘As profecias desaparecerão, as línguas cessarão, mas a
caridade permanecerá para sempre’ (1 Cor 13. 8). E
esclarece a causa desse amor: “Amar-Te-ei dessa
maneira, porque Tu és a minha fortaleza, pela qual Eu
(Jesus) e os meus membros somos fortes; …e o
fundamento para não perder a santidade…; e a
segurança para não temer os ataques do inimigo; e o
Libertador, para não sermos dominados pelos nossos
adversários; e o meu Deus e a minha ajuda” (Com.
p.53). Desnecessário é dizer que bem podemos
aplicar-nos essas palavras do salmista e do expositor.

Oração conclusiva.
E porque o amor não tem limites, imploramos a
“imensidade do amor de Deus”, para que, “pela
intercessão do nosso P. S. Bruno, nos conceda a graça
de cumprir fielmente os votos que fizemos e alcançar,
pelo caminho seguro, o porto prometido aos que Vos
procuram com perseverança”.
63
Podemos notar aqui a especial menção da imagem “do
porto tranquilo e seguro” empregada por S. Bruno,
para indicar a felicidade e facilidade da nossa vocação:
“Porto que, se perdido, lamentar-se-á durante toda a
vida” ( cf. Carta aos Monges da Chartreuse).

MISSA.

O formulário escolhido como próprio para a


Missa da festa do N.P. S. Bruno é muito belo,
sugestivo e apropriado. Visa, com efeito a procura de
Deus, tema tão essencial na vida monástica e
cartusiana. Lembre-se o conhecido “si quaerit Deum”
“se verdadeiramente procura Deus”,exigido por São
Bento como primeira condição para ser monge e que
nossos Estatutos têm conservado. E a escolha desse
tema está bem fundamentada: sabemos como era
grande em S. Bruno o desejo de Deus, a procura de
Deus, a posse de Deus, uma vida para Deus. Vamos
intentar, pois, expor esse formulário, empregando
também, em quanto possível, as palavras do nosso P.
Fundador tiradas, como até agora, dos seus
Comentários.

64
Cântico de entrada.

“Diz-me o coração: ‘Procurai a sua Face’. A vossa


Face, Senhor, eu procuro; não escondais de mim o
vosso Rosto”. O Senhor é a minha luz e salvação: A
quem hei-de temer?” (Sl 26. 8-9; 1).

“Quando o cristão se retirava para o deserto e se


tornava monge, só procurava uma coisa: Viver como
verdadeiro cristão na companhia de Deus” (R.
Draguet, Les Pères, p. XLVII). E a esse propósito
refere-se o Cântico de entrada, como eco profundo do
coração do monge enamorado de Deus. Nosso P. S.
Bruno foi chamado “Eremita enamorado de Cristo”
(Tít. 66 e 81).
É que a sua alma, já quando era novo, sentia-se
devorada por essa sede de Deus. Vemo-lo na pequena
Elegia “De contemptu mundi”, escrita na sua primeira
juventude: “O Senhor tem criado todos os mortais
neste mundo, a fim de que alcancem, pelos seus
méritos, as alegrias do Céu. Feliz aquele que
continuamente dirige a sua alma para essa meta e
guarda-se vigilante de todo o que a possa prejudicar”
(PL.152.38).
Mas vejamos qual é o comentário que nos faz
sobre as palavras do Intróito: “Não clamaria, se não
65
falasse o meu coração. E este diz: ‘Procurei a vossa
face’, ou seja, com toda a diligência, com as obras e
com o afeto procurei Aquele que agora veio no
enigma da fé, mas a quem verei logo face a face. Sim,
procurei a vossa face pensando bem e operando
retamente. Por isso Vos suplico: Não escondais de
mim o vosso rosto! por causa dos meus pecados…
Sim, não está bem que o afasteis de mim, sendo como
sou, vosso servo e procurando ser-Vos obediente em
tudo”. “O Senhor é a minha luz, porque me iluminou
no batismo com a fé; e a minha salvação, porque me
livrou dos meus pecados. Sendo assim, a quem hei-de
temer, qual o inimigo invisível que me dominará?
Nenhum! (Com. p. 90. 89).
Cantemos, pois, a Antífona da entrada com esse
mesmo espírito, com um desejo ardente de
procurarmos sempre a Deus. Que esse seja sempre o
supremo anelo do nosso coração de filhos de Bruno.

Oração.
A Oração apresenta a Deus, “que recompensa
com as moradas eternas a quantos renunciam o
mundo”, o nosso maior desejo neste dia: “a graça de
cumprirmos fielmente os nossos votos (equivale a
viver a vocação recebida através de Bruno), e de
alcançarmos com segurança o porto prometido a
66
quem persevera fielmente na busca de Deus”. É que
“só quem perseverar até o fim, será salvo” (Mt 10,
22).

1ª. Leitura
Rm 8. 22-30. O denso conteúdo da leitura lembra-
nos as aspirações mais profundas do coração
contemplativo, enquanto experimenta as aflições do
mundo presente: a perfeita filiação divina e a definitiva
redenção do nosso corpo. É a meta da nossa
esperança. Ora, nessa espera, contamos com a
presença do Espírito que mora e ora em nós e por nós,
em conformidade com o querer de Deus. E graças a
essa presença, amamos a Deus, a esse Deus que nos
escolheu, nos predestinou a sermos imagem do seu
Filho, nos chamou, nos justificou, nos glorificou e que
faz com que tudo concorra para o bem de quantos O
amamos. Tal é o amor e a conduta de Deus a nosso
respeito. E correspondermos a esse amor é o supremo
anelo do nosso espírito.

Responsório
(Sl 117. 8-9). Tão experimentado temos esse amor
divino, que a nossa resposta é um ato de confiança
filial: “Mais vale refugiar-se no Senhor, do que fiar-se
nos homens. Mais vale refugiar-se no Senhor, do que
67
fiar-se dos poderosos”. Eis o comentário que nosso Pai
faz desses versos: “Sendo Deus tal protetor, que faz
com que seus filhos não temam os inimigos antes os
desprezem, é bom confiar no Senhor na tribulação,
mesmo padecendo por Ele, antes que confiar nos
perseguidores com a intenção de salvar a vida
corporal. E o salmista fala comparativamente, para
indicar que é mais útil esperar a salvação do Senhor,
através das asperezas das tribulações, do que fiar-se
dos homens mundanos para conseguir deles a
felicidade terrena” (Com. p. 521).

Aleluia
(Sl 107. 2). O monge, confiando e esperando desse
modo no seu Senhor, sente o seu coração bem
disposto para levar a cabo o seu propósito de procurar
Deus custe o que custar. Por isso canta neste belo
Aleluia: “Firme está o meu coração, ó meu Deus, meu
coração está firme: Quero cantar e tocar para Vós,
minha glória!”. Nosso Fundador aplica este salmo a
Cristo e coloca nele estas palavras: “Embora pela
fraqueza da minha natureza humana hei-de sofrer na
Paixão, contudo o meu coração está firme; quer dizer,
a vontade da minha alma está disposta para padecer; e
repete-o duas vezes, para que os seus discípulos
fiquem advertidos e estejam preparados a fazer o
68
mesmo. E Eu, porque estou assim preparado, cantar-
Te-ei, ó Pai, com a devoção interior, e tocarei para Ti
com o meu comportamento exterior. E tudo isto para
Minha glória; quer dizer, na consideração dessa glória,
pois estou certo que serei glorificado nessa natureza
humana, quando receba a imortalidade e a
impassibilidade” (Com. p. 490).

Evangelho
(Lc 12.35-40). Mencionámos mais acima este
evangelho (Cf. pág. 51). É uma viva exortação à
vigilância, em conformidade total e em perfeita
sintonia com a procura de Deus mencionada no
Cântico da entrada.
Com efeito, não basta com querer buscar Deus,
nem é suficiente procurá-l’O de qualquer modo;
quem procura Deus deve fazê-lo com todo o ardor do
coração, com todo o afeto da sua alma. Ora, desse
ardor amoroso nasce a vigilância: vigia-se e vela-se
sobre aquilo que é muito querido. Se Deus é o nosso
grande amor, é natural que a alma vele e esteja
sempre preparada para a vinda do seu Senhor, afim de
Lhe “abrir a porta, logo que chegar e bater”. Ou seja,
para poder dar ao Senhor uma resposta de amor, logo
que Ele pedir seja o que for.

69
Desnecessário é dizer que só com essa absoluta
dedicação e disposição de amor, será possível a íntima
união com Deus na doçura da contemplação, aqui
prefigurada pela refeição servida pelo mesmo Senhor.
E como não sabemos nem o dia nem a hora em que o
Senhor virá a nós, temos de viver numa constante e
amorosa espera, inclusive quando esta seja trabalhosa
ou dolorosa. É o que o Senhor quer indicar quando
menciona o detalhe de “esperar com as cintas
apertadas e com as lâmpadas acesas”. “Com as cintas
apertadas” indica-se a disposição para trabalhar, vigiar,
a todo o momento, E, aliás, no tempo de nosso
Senhor, manter as lâmpadas acesas exigia um grande
cuidado e laboriosa atenção.

Ofertório
Nesta antífona ofertorial, temos uma bela resposta à
admoestação que o Senhor nos fez no Evangelho,
sobre a vigilância e atenção à sua vinda: “Senhor, Vós
sois o meu Deus!, desde a aurora Vos procuro e em
vosso louvor levantarei as minhas mãos” (Sl 62. 2-5)
A vida do monge, como a do salmista, depende
totalmente de Deus, está voltada e votada para sempre
ao seu Senhor; e é na plena união com Ele, “no face a
face” prometido e esperado, que está todo o anelo da
sua alma. O Senhor diz no texto mencionado: “Felizes
70
os servos que o Senhor encontrar vigilantes…Estai vós
também preparados”. A alma responde com toda a
sinceridade do seu amor: Cada dia, “desde a aurora,
Vos procuro”; quer dizer, monto a minha sentinela, a
minha vigilância, a minha espera; e, entretanto, me
dedico a louvar o Vosso amor e proclamar a vossa
misericórdia para comigo. A alma sente profundas
saudades das suas melhores experiências divinas
quando, seduzida por Deus, experimentou algo da Sua
graça e vida, do seu poder e beleza, da sua luz e
misericórdia, que lhe comunicaram a força para O
seguir e viver para Ele nos caminhos do deserto.
Porque, foi nesse deserto, que experimentou também
como é duro viver longe de Deus e sentir, com Jesus
algo da noite, do abandono, da secura e agonia do
Getsémani. Mas, colocada em vela á espera da vinda
do Senhor, suporta tudo com a experiência desta
vivida realidade: “Unido estou a Vós, Senhor!”, como
diz o salmo.
Dos seus filhos de Calábria, nosso Pai escrevia ao
amigo Raul: “Vivo com os meus irmãos religiosos…,
que, em permanente e santa guarda, ‘esperam o seu
Senhor a fim de Lhe abrirem a porta, assim que Ele
chegar e bater”. Que a nossa vida actual seja como a
daqueles primeiros filhos, para que se cumpra também
em nós o desejo que ele expressa no comentário das
71
palavras deste Ofertório: “Que a nossa vida seja um
viver vigiando à espera do Senhor, pois essa é a
melhor de todas as vidas”. Enfim, que como ele,
também nós possamos dizer ao Senhor que esperamos;
“Eu vigio louvando-Vos com a minha voz e com a
minha vida” (Com. Sl 65. p. 250).

Oração.
A oração sobre as oblatas coloca-nos dentro da
fonte de toda a graça e do centro vital da solenidade: a
Eucaristia. Por isso pedimos a Deus que nos seja
concedido, pelos méritos de Nosso Pai São Bruno
“podermos oferecer um sacrifício que Vos seja
agradável, em memória da Paixão do vosso Filho e da
nossa Redenção”. Lembremos hoje que a nossa
entrega a Deus, na Profissão, foi feita no Ofertório
duma Missa, para que fosse aceite e apresentada ao
Pai, com a “entrega” e o “Sacrifício” de Cristo. E
graças a essa aceitação, vivemos ainda a entrega feita e
esperamos vigiando a vinda do Senhor.

O Prefácio dos monges.


Este Prefácio, bela aquisição da renovação do missal
cartusiano, vem lembrar-nos o fundamento da nossa
vocação monástica e a suprema finalidade da mesma.

72
Com efeito, diz-nos que os santos eremitas que
optaram pelo deserto, outra coisa não faziam senão
seguir, viver e prolongar no mundo o exemplo de
Cristo que, “na solidão do deserto, numa oração
contínua, realizou na sua pessoa o mistério da
salvação”.
Já é sabido: toda a vida de Jesus foi um realizar o
mistério da nossa redenção, quer em Nazaré, como no
deserto, nas cidades e no Calvário. Ora, todos esses
estados da sua vida redentora de Jesus não podem ser
vividos no seu conjunto, nem por um só indivíduo em
particular, nem por uma única família religiosa na sua
totalidade. É por isso que o Espírito Santo suscita
tantos Institutos na Igreja em todo o tempo, para que
entre todos tornem presente e permanente no mundo
todos os estados da vida de Jesus (cf. LG 46). A nós,
como monges solitários, foi-nos concedido perpetuar
a vida oculta e solitária de Jesus, sobretudo vivendo no
deserto entregue à oração e realizando desse modo o
mistério da salvação. Eis a sublime tarefa do nosso
viver solitário; e na nossa união com Jesus é que radica
a fecundidade da nossa vida e que nos tornamos
“redentores com o Redentor”.

73
Comunhão
O cântico final da nossa celebração eucarística vem
a ser o eco e a coroa de todos os textos desta Missa,
que nos falaram da procura, da espera, do desejo de
Deus e da Sua vinda. E é o próprio Senhor quem nos
dá a última exortação sobre a vocação que nos
outorgou por meio de S. Bruno: “Feliz o servo a quem
o seu senhor, ao voltar, encontrar vigilante. Em
verdade vos digo, confiar-lhe-á todos os seus bens”
(Mt 24. 46-47).
Se aplicamos estas palavras a Nosso P. S. Bruno,
teremos a explicação da presente solenidade. Na
verdade, porque foi fiel na sua vigilância e serviço ao
seu Senhor, Este lhe concedeu “todos os seus bens”, o
prémio duma vida contemplativa amorosa e
santamente vivida: a plena posse de Deus
intensamente procurado, encontrado e possuído pelo
amor. E se essa é a recompensa recebida como fiel
contemplativo, também recebe a recompensa como
Fundador e que lembramos no 1º. R.M. das Matinas:
“Abençoar-te-ei, engrandecerei o teu nome e serás
uma fonte de bênçãos” (Gn 12. 2). E no Pai Fundador,
fomos e somos abençoados os seus filhos; e recebemos
sem cessar atravês dessa “fonte de bênçãos”, as graças
vocacionais e os auxílios oportunos para levar a cabo o
nosso propósito. É que existe uma “misteriosa
74
dependência filial”, criada pelo Espírito, entre o
fundador dum Instituto religioso e todos os membros
do mesmo que vivem o espírito daquele. Ele é o canal
escolhido pelo Espírito, para nos transmitir as graças
que hão-de fazer de nós “verdadeiros filhos de Bruno”.
Nessa linha de pensamento, todos e cada um
podemos tomar como ditas a nós próprios as palavras
da Antífona da Comunhão e tirarmos daí ocasião para
nos excitar na vivência dessa permanente vigilância
que nos impõe nossa vocação cristã e cartusiana.

Pós-comunhão.
De fato, é isso o que a Igreja nos faz pedir na última
oração desta Missa: “Por esta eucaristia que temos
recebido, Senhor Deus, reavivai em nós o amor pela
nossa vocação, para que, seguindo os passos de nosso
Pai São Bruno, e cumprindo com a Vossa ajuda o que
pela Vossa bondade prometemos, mereçamos
encontrar-Vos a Vós para sempre” (Oração pós-
comunhão).

Horas Menores.

Nas Horas Menores encontramos também uma


apropriada e oportuna “mensagem” para cumprirmos
o que acabamos de pedir na Oração final da Missa.
75
Com efeito, ao retomarmos as antífonas de Laudes,
somos ajudados para que todo o Dia da festa
transcorra impregnado do espírito das Bem-
aventuranças. Assim:

Na Prima, lembra-se-nos que, só com um coração de


pobre, como Jesus, poderemos chegar ao Reino dos
Céus.

Na Tércia, recordamos que a pureza de coração é o


caminho seguro para podermos ver a Deus.

Na Sexta, temos indicado o meio infalível para o


nosso encontro com Deus: a oração solitária com Ele.
A leitura dá-nos uma mensagem que bem podemos
aplicar à vida do nosso Fundador: “Encontrou-o numa
região deserta; protegeu-o e velou por ele: guardou-o
como a menina dos seus olhos. Só o Senhor o
conduziu” (Dt 32. 10-12). E com a mensagem de
Deus, a oração dos filhos: “Ó Deus, que chamastes S.
Bruno para Vos servir na solidão, concedei-nos por
sua intercessão, que no meio das vicissitudes deste
mundo, vivamos sempre disponíveis para Vós”
(Oração da Sexta).
Enfim, a Antífona de Noa lembra-nos uma especial
virtude, característica das almas que vivem na
76
intimidade com Deus, a misericórdia: “Sede
misericordiosos como o vosso Pai é misericordioso,
diz o Senhor” (Lc 6. 36). Diz um autor: “Entre todos
os atributos de Deus, a misericórdia é o mais famoso”.
A misericórdia é o amor dado aos outros. Sabemos a
insistência de Jesus sobre a prática da mesma. A
leitura lembra-nos os eixos do nosso viver monástico:
a fé, o amor e a posse do Espírito fraterno: “Este é o
mandamento de Deus: acreditar no nome do Seu
Filho, Jesus Cristo, e amarmo-nos uns aos outros. Nós
sabemos que Deus permanece em nós pelo Espírito
que nos deu” (1 Jo 3. 24-24). Mas, porque não basta
saber, antes é preciso praticar o conhecido,
apresentamos ao Senhor a nossa humilde prece: “Ó
Deus, que nos mostrastes o caminho da perfeição com
o exemplo do nosso pai São Bruno, concedei-nos que,
por meio da obediência que prometemos ao Espírito
Santo, sigamos fielmente a Cristo, Vosso filho”
(Oração de Noa).
É que, se Jesus faltar, perde-se o centro e o ímã que
une nossos corações em torno a Ele. Somos átomos
isolados e dispersos a quem não fusiona a mística
gravidade do seu Coração. Dir-se-ia que uma maléfica
força centrífuga nos separa e dispersa dos nossos
irmãos e nos faz correr em direções opostas.

77
II. Vésperas.

As antífonas escolhidas para este comum de


Monges têm, diríamos, um profundo sentido
monástico; quer dizer, uma nítida orientação para a
vida do monge na sua dedicação ao Senhor numa
comunidade de filhos de Deus. Assim, lembram-nos:
A união que devem manter todos os chamados a viver
uma mesma vocação (1ª); a vida de fé com que esse
compromisso deve ser realizado, para que nos leve
realmente à vida eterna (2ª); a interdependência
existente entre a verdade da vida vivida e a luz de
Deus (3ª); enfim, o supremo ideal de todo o servo de
Deus e a obra por excelência do monge: a adoração
(4ª).
Por outro lado, as antífonas evocam também os
grandes temas centrais do Ofício, sob o prisma do seu
cumprimento em nós. Realidade esta que é um fruto
precioso da oração de Jesus, que ora em nós e por
nós. Por isso, os salmos escolhidos têm um forte
sentido cristológico. Vejamos:
1ª. Ant. “Pai Santo, guarda em teu Nome aqueles que
me deste, para que sejam um, assim como
Nós somos Um” (Jo 17. 11).
Fomos “convocados” pelo mesmo Amor de Deus, e
fomos “colocados” pelo Seu Espírito numa mesma
78
“família” e na “convivência” dum mesmo carisma.
Então, o nosso viver monástico não consiste só em
vivermos juntos no mesmo mosteiro, senão em
estarmos e vivermos unidos pelo mesmo vínculo que
une Jesus ao Pai, pelo Espírito. Esse vínculo é o amor
que implica uma inter comunhão e reclama uma
mútua pertença, por meio de Jesus Cristo. Jesus pede
ao Pai essa união de amor, única que pode manter-nos
unidos e formar um só corpo, até constituirmos todos
“um só coração e uma mesma alma”; ou como diz
Jesus: sermos um como as Divinas Pessoas são Um.
Deste modo, a realidade divina da nossa vocação
prevalece sobre o pobre e diverso elemento humano
que somos nós. Nosso P. S. Bruno adverte-nos: “É
evidente que já habitamos todos reunidos num mesmo
lugar, que temos todas as coisas em comum e que
vivemos como irmãos; mas não sejamos irmãos
perversos, senão irmãos pelo espírito, tendendo à
unidade da fé e da concórdia; se isto não fizermos,
para nada aproveita morarmos no mesmo lugar”
(Com. p. 604).

2ª. Ant. “Em verdade, em verdade vos digo: Quem


acredita em Mim, tem a vida eterna” (Jo 6. 47).
A vida monástica só é compreendida na dimensão da
fé, e só na onda da fé é que pode ser realizada. Nós
79
acreditamos na vocação como chamada de Deus;
como convite do Filho para O seguirmos e imitarmos;
e como apelo do Espírito Santificador. Unidos ao Filho
vamos para o Pai, e as suas palavras são para nós,
realmente, “espírito e vida” (Jo 6. 64). E quanto maior
for a nossa disponibilidade para as ouvir, tanto maior
será o progresso da nossa vida em Jesus e, em
consequência, tanto mais crescerá a nossa união e
intimidade com Deus. Ora, essa vida divina que
vivemos não é só para este mundo presente, mas
também para o futuro: “a graça é início e semente da
glória”. Com esta antífona, Jesus parece dizer ao
monge: Quem acredita em Mim vivendo a minha
vida, guardando as minhas palavras, seguindo as
minhas pegadas, tem a vida eterna.
Sabemos que a fé sem obras é uma fé morta. Não
podemos esperar a vida eterna prometida à vida
monástica, se não fizermos as obras monásticas que
levam para a vida eterna.
N.P. S. Bruno, comentando as palavras do salmista:
“Posuisti animam meam ad vitam” (Sl 45. 9), comenta
deste modo: “Se na vida laudável em que viveis para
Deus, surgirem perseguições contra vós, não a
abandoneis por medo; antes, perseverai com paciência
para chegardes à vida…Deus humilha a nossa
sensualidade com as tribulações que permite, para que
80
através das mesmas alcancemos a vida eterna” (Com.
p. 264).
3ª. Ant. “Quem pratica a verdade, aproxima-se da luz
a fim de que as suas obras sejam manifestas,
pois são feitas em Deus”( Jo 3. 21).
O monge, como filho de Deus, é também “filho da
luz” (Ef 5. 8) e deve andar, comportar-se como os
filhos da luz. Deus é a Verdade e a Luz. Se o monge
vive unido a Deus, deve manifestar com as suas obras
essa união; quer dizer, com o seu proceder deve
manifestar, embora sem palavras, que está com Deus e
que tudo faz por Ele.
Esta antífona traz à memória as palavras que
cantaremos logo no verso 5 do salmo 115: “Cumprirei
as minhas promessas ao Senhor, na presença de todo o
povo”. E evoca-nos a nossa missão na Igreja. Mesmo
escondidos “no oculto da Face do Senhor”, a vida do
monge deve ser luz; e como João Batista, deve ser
“uma lâmpada ardente e brilhante” no Corpo Místico
de Cristo.
E não, certamente, pelo que faça exteriormente
com as suas obras e palavras, senão pela sua oculta e
íntima união com Jesus. E se, unido a Jesus, for “Lux
in Domino”, comunicará essa luz às almas, de modo
misterioso e invisível, mas eficaz. O Decreto AdG

81
lembrou-nos esse dever (cf. nº.40) na tarefa da
expansão do Evangelho.

4ª. Ant. “Ao Senhor teu Deus é que hás-de adorar, e


só a Ele prestarás culto” (Mt 4. 10).
No Ofício dos monges não devia faltar uma menção
ao seu principal dever: a adoração e o culto a Deus, ao
qual está consagrado de por vida. “A vida
contemplativa desempenha uma das principais funções
no corpo Místico… através dessas almas grandes e
nobres que desejam cumprir no silêncio do claustro, a
consigna evangélica: “Deus é espírito, e os Seus
adoradores em espírito e verdade é que devem adorá-
lO” (S. João XXIII. Recens a te. 20-10-60). E o V.
Paulo VI também lembrou-nos aos cartuxos esse
dever: “Toda a Igreja está interessada em que perdure
esta forma de vida, quer dizer, em que os seus
membros, desejosos de dar a Deus a honra que Lhe é
devida, consagrem perpetuamente as suas forças à
adoração do Senhor” (Paulo VI, Optimam partem. 19-
05-89). E também vale para nós o que noutra ocasião
o mesmo Papa disse às monjas contemplativas: “Estais
dedicadas à oração e à procura de Deus…A Igreja
considera-vos a expressão mais pura dos seus desejos.
Não estais marginadas, antes no coração mesmo da
Igreja…Tudo isso sois vós no amor intenso por Jesus,
82
em cujo coração ledes os Seus desejos e respondeis
com um “Sim!” que dura toda a vida” (Obs. Rom.12-
9-71).
O salmo que cantamos a seguir tem belas
ressonâncias para a alma do monge contemplativo.
Com efeito, põe nos seus lábios um harmonioso
louvor a Deus, sempre Pai providente. E nesse
louvor, cada pessoa, cada voz, cada coração, converte-
se num elemento insubstituível do cântico que
elevamos a Deus, “sempre merecedor dum louvor
belo e agradável”. Hoje, festa do nosso Pai e
Fundador, procuremos que o amor, “derramado em
nós pelo Espírito”, nos harmonize e funda num só
amar, sentir, pensar e cantar.
N.P. S. Bruno comenta assim o primeiro verso do
salmo mencionado, colocando estas palavras na boca
do salmista: “Ò fiéis, louvai o Pai pelo futuro tempo
da graça com um salmo, porque é útil para vós
salmodiar; sim, é útil e salutar louvar a Deus com
salmos, porque esse salmodiar, sendo alegre, deleita o
Senhor…; como dizendo, mesmo que para vós seja
útil salmodiar, oferecei a Deus um louvor sálmico
alegre e harmonioso. E porque o salmodiar está
acompanhado do saltério, onde a voz do salmista
ajunta-se à operação da mão, interpreta-se esse
salmodiar como o louvor que rendemos a Deus com
83
as nossas boas obras e com o tributo da nossa voz;
quer dizer, louvamos a Deus com a nossa voz exterior
e com o nosso afeto interior” (Com. p. 657).
Esta 4ª. antífona, como aliás o Invitatório de
Monges das festas de 3 leituras, convida-nos à
adoração, pois esta é a suprema manifestação do culto
que o homem deve a Deus, seu Senhor (cf. Sl 94, 6).
Sobre esse verso, N.P. S. Bruno deixou-nos este
comentário, como se fosse uma exortação do salmista
dirigida aos seus contemporâneos, mas com dimensão
messiânica: “Disse que o Cristo será Deus, o Rei e o
Grande Senhor; portanto, vinde junto dele com a fé e,
vindos, adoremo-lO como eu O adoro; a saber,
orando especial e intensamente, venero-O; é assim
que vós deveis adorar. E prostremo-nos por terra, ou
seja, humilhemo-nos com toda a alma, sinal do qual é
a prostração; e choremos os nossos pecados, não para
recebermos o louvor dos homens, mas na presença de
Deus; desse Deus que nos criou e que, por isso
mesmo, devemos adorar” (Com. p. 128).

R. P. “Senhor, Vós sois a minha esperança desde a


minha juventude”. (V). “Desde o nascimento
Vós me sustentais, desde o seio materno sois o
meu Protetor”.

84
Dom Guigo, falando nos Costumes da utilidade
que tem para o homem levar o jugo do Senhor desde a
sua mocidade, acrescenta esta observação sicológica:
“Nessas palavras encontramos uma grande alegria, nós
que, quase todos, temos abraçado esta vocação desde a
nossa juventude” (Costumes, 80. 7).
E dir-se-ia que este belo Responsório, cantado
anteriormente na Setuagéssima, vem lembrar-nos, no
encerramento desta solenidade, essa utilidade e
alegria. Com efeito, se perseverámos até hoje, não foi
pelos nossos méritos pessoais, senão pela pura e
gratuita benevolência de Deus. É, pois, com toda a
justiça e razão que podemos -e devemos! - cantar bem
alto com o salmista: “Senhor, Vós sois a minha
esperança desde a juventude” (R). Sim, e não só desde
o dia abençoado em que nossos pés pisaram os
umbrais do deserto do nosso mosteiro, mas desde
muito antes: “Desde o nascimento Vós me sustentais,
desde o seio materno sois o meu Protetor” (V).
N.P. S. Bruno proporciona-nos este comentário:
“Tenho a minha esperança em Vós, porque desde a
minha juventude fui provido de conselho e exercitei-
me com valentia na prática da obediência; de
contrário, a minha esperança seria vã. E fala assim,
porque os jovens devem seguir os conselhos prudentes
e serem constantes na prática dos mesmos” (Com. p.
85
295). Graças a Deus porque o Seu amor nos
envolveu desde o nosso nascimento e Cristo é a
esperança da nossa vida e da nossa glória!

Antífona do Magnificat.
Realmente, não se podia escolher uma antífona mais
bela e estimulante para o encerramento da nossa festa
familiar e vocacional.
Com efeito, nela temos, em resumo: o segredo íntimo
da nossa vocação cartusiana: “O próprio Pai vos ama”;
a força para a realizarmos: “Vós Me amastes”; e a
consequência desses dois amores conjuntos: “Pedi e
recebereis, para que a vossa alegria seja completa” (Jo
16. 27). Sublime condescendência de nosso Mestre e
Senhor!
Fruto genuíno e imediato da vida contemplativa é a
familiaridade com Deus, considerado como ”Pai”; e
consequência natural dessa familiaridade é a confiança
filial, que tudo pede e espera de Deus.
A vida do monge, já o sabemos, é um incessante viver
com esse Pai, sempre procurado com ardor,
encontrado com facilidade e possuído com crescente
perfeição (cf. Est. 1,4). É a plenitude da vocação
cristã. E porque é assim, nosso Senhor convida-nos
para pedirmos a esse Pai, que tanto nos ama e a quem
tanto queremos amar, tudo o que nosso coração filial
86
precisar. Notemos que Jesus não faz nenhuma
indicação sobre o objeto da nossa súplica; ao
contrário, declara-nos a amplidão do limite: “tudo”.
Sim, tudo o que possa concorrer para que a nossa
alegria “seja completa”, segundo o querer de Deus.
Mas, o mais interessante é que, de antemão, nos
assegura a concessão do pedido. É que Jesus conhece
bem como é grande o amor que o Pai nos tem, e não
ignora a sinceridade do amor com que o monge quer
amá-lO, embora o crescimento desse amor não tenha
limites. Se a vida monástica reclama generosidade ao
amor prometido, Deus não Se deixa vencer por
ninguém em generosidade e amor. Nenhum pai é tão
complacente e bondoso com seus filhos. E aí está o
segredo da alegria dos monges autênticos e da alegria
do nosso P. S. Bruno e da alegria que gera a vida
cartusiana vivida no amor.
Já é sabido; a alegria era uma das características do
espírito de nosso Fundador. A sua alma estava de tal
modo compenetrada da alegria de Deus e inundada
com o gozo do Espírito Santo, que com frequência
afloram nos seus escritos os términos “alegria”,
“exultação”, “gozo”, “contento”, “júbilo” e outros
similares, até falar “da divina alegria”, “do divino gozo
e prazer”. Aliás, sabemos, que “tinha sempre cara de
festa”; e “que desejava que os seus estivessem sempre
87
alegres” (Títulos de Calábria e do 149); que se alegra e
rejubila ao saber que seus filhos permanecem fiéis ao
seu ideal, e não duvida em manifestar a sua alegria,
empregando para isso as mesmas palavras com que
nossa Senhora significou a sua profunda alegria em
casa de Zacarias (cf. Carta a Chartreuse). E quando
escreve ao seu amigo Raul, promete-lhe, se for fiel à
sua vocação, “a paz que o mundo ignora e a alegria no
espírito Santo” (Carta a Raul, 6). É que Deus é a fonte
das mais puras alegrias e quem está unido a Ele, bebe
com abundância dessas águas que transformam as
almas em rios de alegria.
Vejamos também algumas passagens do seu
Comentário aos Salmos, em que aparece com toda a
sua nitidez essa atitude espiritual da sua alma. Assim,
no comentário ao salmo 67, lemos: “Ò justos, exultai
de alegria e, a fim de chegardes à mesma, cantai ao
Senhor, quer dizer, louvai-O na contemplação…;
aplicai-vos à vida contemplativa, que consiste em
vacar à oração e à meditação dos divinos mistérios,
deixando de lado tudo o que é terreno” (Com. p.
270). E também: “Para vivermos cada vez mais na
alegria, nos Vos suplicamos, Senhor, mudai o nosso
cativeiro em liberdade e assim recolheremos na
exultação da alegria a recompensa eterna” (Ib.).

88
“Louvai a Deus na alegria interior do espírito, uma
alegria essa que não pode ser explicada de palavra ou
por escrito; ou seja, louvai-O com uma intensa
devoção” (Com. p. 262).
E porque nosso Pai e Fundador é realista e não
ignora que a alegria do monge pode ter também os
seus inimigos, escreve: “Alegrai-vos e, se o mar se
levantar contra vós, que importa? Repito: Alegrai-vos
mesmo que o mar se voltar contra vós. Nada
importa!” (Com. p. 438).
E para N. P. S. Bruno, a alegria não era só para a
alma, também o corpo deve participar dela. Por isso
escreve: “Os justos alegram-se também com o corpo,
porque Vós, Senhor, tendes misericórdia deles, para
que não fiquem dominados pelos sofrimentos da vida.
E alegram-se com as suas almas, porque as libertais das
consequências do pecado. E alegrar-se-ão não só na
vida futura, mas também na presente, porque não
permitis que fiquem aniquilados com o poder do
demónio; para isso, colocais os efetos dessa alegria na
região dilatada da fé e do amor” (Com. p. 101 ss).
Enfim, lembremos este belo testemunho:“Perdi a
alegria do meu Salvador, com a gravidade do meu
pecado e por isso Vos peço perdão; e espero que com
ele me devolvas a alegria do meu salvador; sim,

89
confirmai-me nessa alegria e fazei-me perseverar nela,
para que nunca mais torne a perdê-la” (Com. p. 192).

Oração final.
A Oração conclusiva das Vésperas encerra a nossa
celebração vespertina apresentando a Deus o mesmo
pedido, a mesma súplica formulada nos Laudes e na
Missa: “Deus todo-poderoso e eterno, que preparais
uma morada no Céu para aqueles que renunciam ao
mundo, dignai-Vos ouvir, no Vosso imenso amor, a
nossa humilde prece: concedei-nos, por intercessão do
nosso Pai São Bruno, a graça de cumprirmos fielmente
os votos que fizemos, e alcançarmos com segurança o
porto que prometeis a quem persevera em Vos
procurar”.

Conclusão

A solenidade do N.P. S. Bruno deve


impulsionar-nos, cada ano, a percorrermos “o
caminho seguro” da nossa vocação, com renovado
fervor do amor e com a perseverança com que ele o
percorreu; só com essa condição chegaremos com
segurança ao “porto que Deus promete àqueles que O
procuram” com sinceridade.

90
O Vaticano II lembrou-nos que o carisma
vocacional do Fundador é participado pelos seus
filhos e que estes, em justa consequência, devem
vivê-lo e conservá-lo em toda a sua pureza na Igreja
de Deus, para a qual foi suscitado pelo Espírito
Santo.
Sim, a graça inicial da fundação da nossa Ordem
não é um dom que acabou com a morte do pai
fundador, nem que, com a sua ausência, se endureça
nas suas formas; antes, sendo uma comunicação do
Espírito Santo, recebe dEle o seu dinamismo espiritual
(cf. PC. 1; ET. 11; Est. 1. 1-4).
Lembramos isto hoje e agora, para que nos
ajude a termos em conta duas coisas: a primeira, o
caráter de permanente mediador do nosso Fundador a
respeito da nossa família monástica; a segunda, que,
aproveitando essa mediação, temos o dever de
prolongarmos no mundo o seu carisma e cumprirmos
a missão que o Espírito Santo nos confiou, a ele e a
nós, dando-nos a mesma vocação cartusiana. Portanto,
somos nós, os cartuxos do s. XXI, os que devemos
cumprir no Corpo Místico de Cristo o ministério
contemplativo que Deus confiou a nosso Pai e
Fundador no s. XI.
Esse carisma cartusiano é uma presença
espiritual que nos traz sem cessar à memória o ideal
91
que abraçamos, aquele “propósito cartusiano”
mencionado por Guigo, que, urgindo-nos a fidelidade,
nos renova sem cessar, interiormente.
Por outro lado, graças a esse carisma recebido
de Bruno, as nossas vidas unem-se para formar a
Família Cartusiana onde, congregados, “não pelo
impulso da carne nem do sangue” (Jo 1.13), senão
pela força do amor “derramado pelo Espírito nos
nossos corações”, a graça da nossa vocação deve
florescer numa comunhão cada vez mais íntima e
perfeita com Cristo, com a Igreja, com os nossos
irmãos (cf. PC. 1).
O carisma de Bruno deve ser “o princípio
unificador e identificador” da nossa Família monástica:
é por ele que devemos reger-nos, é por ele que nos
diferenciamos dos outros monges e é por ele que a
Família Cartusiana será “cartusiana”; quer dizer, aquilo
para o qual Deus escolheu Bruno como Pai e
Fundador. Nossa Família monástica tem bem traçado,
desde o seu início, o querer de Deus ao seu respeito e
o caminho por onde deve caminhar para o realizar.
Desnecessário é dizer que devemos alimentar
uma verdadeira piedade filial para o nosso Pai
Fundador; uma piedade sincera que nos impulsione
para imitarmos as suas virtudes, para vivermos com
generosidade e autenticidade a vocação que, por meio
92
dele, Deus nos outorgou tão bondosamente, e que nos
mantenha sempre unidos em Cristo Jesus e vivificados
pela força do Espírito Santo que nos chamou.
E se existe um dia em que devamos orar de
modo especial pela nossa Família monástica, esse é o
dia em que celebramos a festa de São Bruno, nosso Pai
e Fundador. Então, encerremos estas reflexões
colocando como final das mesmas esta oração pela
nossa Família monástica e, em concreto, pela
Comunidade em que intentamos ser e viver como
filhos de S. Bruno.

Oração pela Comunidade


Pai, hoje quero pedir-Vos
pelos meus irmãos de Comunidade.
Vós os conheceis pessoalmente:
conheceis os seus nomes e sobrenomes,
as suas virtudes e os seus defeitos.
as suas alegrias e as suas penas,
a sua fortaleza e a sua fraqueza,
sabeis toda a sua história;
e aceitais todos como eles são
e os vivificais com o Vosso Espírito.

93
Vós, Senhor, os amais,
não porque eles sejam bons,
senão porque são Vossos filhos.
Ensinai-me a amá-los de verdade,
à imitação de Jesus Cristo,
não pelas suas palavras ou pelas suas obras,
senão por eles mesmos,
descobrindo em cada um,
especialmente nos mais débeis,
o mistério do Vosso infinito amor,
que faz deles Vossos filhos amadíssimos.
Obrigado, Pai, pelos irmãos que me destes.

Todos são um presente para mim,


um verdadeiro “sacramento”,
um sinal sensível e eficaz
da presença do Vosso Filho.
Dai-me um olhar límpido,
o olhar de Jesus,
para os contemplar,
e dai-me o seu Coração
para os amar, como Ele, até ao extremo.
Porque também eu quero ser
para cada um deles “um sacramento vivo”
do Vosso amor e da presença de Jesus.

94
EPÍLOGO

A comemoração dos 500 anos da canonização do


nosso Pai e Fundador foi a ocasião da realização e
entrega deste trabalho. Não é preciso dizer que o
principal a ter em conta nesta celebração é a santidade
de vida de nosso Pai e Fundador. Foi a sua melhor
resposta ao carisma recebido pelo Espírito Santo. E
nela encontramos o modelo, a maneira peculiar de
vivermos a nossa consagração a Deus, de vivermos

95
para Ele e de nos deixar santificar pelo Espírito
Santificador.
S. Bruno e seus companheiros, chegados ao deserto
de Chartreuse, “colocaram-se sob a direção do
Espírito” (Est.1.1); e esse mesmo Espírito é quem
vivifica e santifica os filhos de Bruno no percorrer dos
séculos.
Com certeza que essa fidelidade seria o melhor
conselho que nosso Pai fundador nos daria no dia de
hoje. De fato, a Igreja não deixa de lembrar aos
religiosos que devem ser como os seus fundadores:
homens do Espírito, alcançados e possuídos pelo
Espírito de Jesus, fieis às Suas inspirações, guiados
pela sua luz, apoiados na Sua fortaleza, conduzidos
pela Sua moção. E insistem em que os consagrados
devem considerar como a primordial tarefa da sua vida
manter viva a sua atenção à voz do Espírito, com uma
absoluta docilidade ao mesmo, para levar a cabo a
vontade de Deus, num contínuo exercício de fé, de
confiança e de amor operativo (cf. MR 12).
O Papa S. João Paulo II disse-nos na VC: “Quem
professa os conselhos evangélicos está obrigado a
aspirar com todas as suas forças à perfeição da
caridade… É um compromisso sublinhado pelos
exemplos dos inúmeros fundadores e fundadoras” (nº.
93). E no mesmo lugar insiste: “Aspirar à santidade é,
96
em sínteses, o programa de toda a vida consagrada…
Um programa que deve começar por deixar tudo por
Cristo…, antepondo-O a todas as coisas, para poder
participar plenamente do Seu mistério pascal”.
Nosso P. S. Bruno procurou sempre a Deus com
sinceridade de coração. Encontrou-O. E agora
contemplamos e festejamos os frutos desse encontro:
a sua santidade.
Se hoje nos perguntássemos: Que esperam Deus, a
Igreja e nosso Pai fundador dos cartuxos do s. XXI?,
acho que a resposta seria a mesma de sempre: O
testemunho duma vida cartusiana santamente vivida
para Deus. E digo “cartusiana”, porque a vida e
doutrina do nosso Pai e Fundador, contida nos
Estatutos, “é para nós a forma e o sacramento da
santidade que Deus destina a cada um de nós” (Est.
35.1).
Na década dos setenta, o V. Paulo VI visitou a ilha
de Sardenha e dirigiu ao clero, religiosos e
seminaristas estas palavras: “Que espera a Igreja hoje
de vós, para que possais chegar a ser verdadeiramente
instrumentos eficazes e autênticos do Evangelho do
Senhor? A resposta é esta: “Sede santos!” Esta é a
consigna que vos deixamos. A Igreja tem necessidade
de santos. Os santos foram os verdadeiros
reformadores da Igreja. E foram-no, colocando-se eles
97
próprios e em primeiro lugar no caminho da
santidade. Esta santidade, fundamentalmente, é só
uma: a santidade de Cristo que, hoje como ontem,
está feita de amor a Deus e ao próximo, de oração, de
luta contra as paixões, de obediência y de amor à Cruz
de Jesus. Esta é a verdadeira renovação de que a Igreja
tem urgente necessidade. Se esta se der, as outras
serão úteis para o Reino de Deus”.
Deixemo-nos levar uns momentos da imaginação:
Se perguntássemos a nosso Pai Fundador, qual seria a
consigna que ele nos daria hoje para nos encorajar no
empreendido caminho cartusiano em que nos
encontramos, pensamos que não seria diferente da
entregue pelo Papa Paulo VI ao clero sardo: “Sede
santos!” E acrescentaria: Vivei a vossa entrega a Deus
com o ardor do amor e a pureza do primeiro dia.
Permanecei no amor e assim permanecereis em Deus.
Tirai d’Ele a luz, a força, a vida e a graça para todo o
Povo de Deus. Sede santos com a santidade de Cristo,
com a santidade de Deus.
Enfim, pensamos também que nosso Pai, que num
dos Títulos foi chamado “Amante filho de Maria”
(Título 131), nos diria hoje e como despedida, as
palavras que S. João Paulo II dirigiu aos religiosos:
“Avivai a vossa consagração seguindo o modelo da
consagração da Mãe de Deus. Procurai um apoio
98
especial em Maria. Que Ela, a Virgem fiel, seja a Mãe
da vossa vida consagrada” (S.João Paulo II. Rd. n. 17).

yyyyyy y

99
ÍNDICE

Prólogo 5
Advertência preliminar 10
Movimento geral do Ofício 17
O Ofício dos Monges 19
Comentado por São Bruno 22
Notícia importante 23
Exposição do Ofício 25
I. Vésperas 25
Matinas 28
I. Noturno 28
II. Noturno 36
III. Noturno 45
Laudes 54
Missa 64
Horas Menores 75
II. Vésperas 78
Conclusão 90
Oração pela Comunidade 93
Epílogo 95
Índice 100

100
2

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