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da Igreja Católica
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Que sabe vocè a respeito
da primitiva Jgreja Cristã?
Muitíssimos sabem pou que êle lia tudo. E êle te
quíssimo sôbre a história ve a seu dispor naquele
dos primeiros anos da tempo uma excelente bi
Igreja fundada por Je blioteca organizada por
sus Cristo. seu amigo e mestre Pan-
De fato, muitos nem fílio, sábio que atraíra
sequer se dão conta de a si largo círculo de eru
que tal história existe c ditos cristãos.
está ao alcance do povo Escritores modernos que
no mundo de hoje. conhecem profundamente
Há muitos relatos es os tempos e escritos de
critos sôbre vários acon Eusébio assinalam que êle
tecimentos importantes nos pri não era o tipo teórico. Antes, a sua
meiros anos do Cristianismo. O mente estava sempre ocupada em
fato de às vêzes desejarmos que adquirir a verdade de outros — dos
êles fôssem mais numerosos e seus contemporâneos, é verdade,
mais completos não destrói nem mas especialmente dos homens le
reduz o valor dos primitivos es trados que o haviam precedido.
critos cristãos que chegaram até Êle estava constantemente absor
nós. Não somente a primitiva vendo fatos que pretendia trans
história cristã é achada esparsa mitir aos outros como uma des
nos escritos dos primeiros sécu crição verídica da Igreja Cristã.
los, mas também uma bem suce Moveu-se imperturbado, numa
dida tentativa de história comple atmosfera de erudição, até que
ta dos três primeiros séculos da a grande perseguição de Diocle-
Igreja foi completada em 324 ciano, iniciada em 303, caiu sô
por um homem chamado Eusé- bre os cristãos com tôda a sua
bio — nome muito comum naque fúria. Êle escapou com vida, em
la época. bora fôsse testemunha ocular da
Nasceu êle por volta do ano mutilação e do martírio de mui
260, provàvelmente em Cesaréia, tos amigos e companheiros seus.
cidade da Palestina, onde foi edu Entre os anos 311 e 318 foi
cado e se ordenou sacerdote. nomeado Bispo de Cesaréia, e foi
Grandemente preparado em fi largamente conhecido dos seus
losofia e em ciências bíblicas e contemporâneos como homem dou
teológicas, as suas obras mostram to e famoso escritor. De fato, os
VOZES N. 50 - ! 1
seus estudos, as suas oportuni e não tentar fazer a fantasia de
dades de investigação, a sua ex sempenhar o papel de fato”.
periência e os seus dotes natu Hoje, muitos historiadores si
rais bem o aparelhavam para pro tuam a conclusão da História da
duzir as obras históricas que lhe Igreja de Eusébio no ano 324 da
granjearam o título de “Pai da era cristã. No ano seguinte Eusé
História da Igreja”. bio estava presente c desempenha
Embora fôsse um escritor mui va papel importante no primeiro
to alentado em muitos terrenos, concílio mundial ou ecuménico da
foram os seus trabalhos no terreno, quilo que então era conhecido (e
da história da Igreja que bene é conhecido hoje) como a Igreja
ficiaram especialmente as gera Católica. Isso tornou-se possível
ções que se lhe seguiram, mesmo pela liberdade de religião e de
até hoje. reunião religiosa proclamada pe
lo Imperador Romano Constanti-
no. Delegados vindos das princi
pais partes do mundo cristão, com
a proteção do Imperador, viaja
ram para a cidade de Nicéia e
nela se reuniram — cidade es
sa desde muito destruída, mas
que estava situada não muitas
milhas a sudeste dessa que hoje
é conhecida como a cidade de
Istambul, na Turquia.
0 concílio reuniu-se em 325 pa
ra proclamar a unidade da ver
dadeira Fé Cristã e prática re
ligiosa para a Igreja Católica.
Êle é um registrador de fatos Na sua composição, na sua or
que podem ser acreditados; por ganização hierárquica e no seu
quanto, como o disse um escritor processo, êsse concílio deveria ser
moderno, “o seu direito à grande um abridor de olhos para mui
za repousa na sua vasta erudi tos católicos modernos e acatóli-
ção e no seu rigoroso senso. Os cos igualmente.
seus poderes de aquisição eram Para os católicos êle mostra
notáveis, e era incansável a sua a sua Igreja vivendo, crendo, cul
diligência no estudo. Êle tinha a tuando e regulando-se ao longo
seu mando, indubitàvelmente, mais das mesmas linhas qual o faz
material adquirido do que qual hoje. Para os não católicos êle
quer homem na sua época... Vi revela até onde as seitas cristãs
sava a pôr os seus leitores de de hoje se apartaram da Fé, do
posse do saber que êle próprio culto e da organização dos pri
adquirira, mas era sempre bas meiros cristãos, que então esta
tante consciencioso para parar aí vam somente algumas gerações
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distantes de Cristo e dos seus mas, na sua qualidade de histo
apóstolos. riador, e com a sua clara e acura
Enquanto ler este folheto, ima da visão do passado, fornece-lhe
gine, se quiser, Eusébio, o histo material de fundo tirado da sua
riador, no ano 325, atuando na História da Igreja então recém-
qualidade de um profissional de escrita. Cita coisas não somente
imprensa ou de relações públicas dos seus próprios escritos, mas
do Concílio em Nicéia. O dever também do seu conhecimento da
dêle é informar os angariadores quilo que outros disseram e es
de notícias e todos os que estão creveram, mesmo se os escritos
interessados nos trabalhos do Con dêstes não chegaram ate nós se
cílio. Isto significa que êle está não pelos excertos que foram pre
falando a você. E não só explica servados nas obras dêle.
o que está sendo feito e por quê,
Permita-me fazer a mi Propontis, e dali você po
nha própria apresentação. de navegar ou para a
Meu nome é Eusébio Pam- nova cidade de Constan
fili. Sou Bispo da Igreja tino ou para o mar Egeu,
Católica na cidade de Ce com acesso a todos os paí
saréia, na Palestina, e ses agrupados à volta do
membro do primeiro Con Mar Mediterrâneo.
cílio Ecuménico da Igre , Se você tiver curiosida
ja Católica aqui em Ni- de de saber por que tan
céia, neste ano do Senhor tos de nós aqui nos reuni
325. mos, vindos de todas as
A não ser pela ameaça partes do Império Roma
de febre palustre, este lugar é no, terei imenso prazer em ex
ideal. A cidade de Nicéia pode plicar-lho. Estou organizando uma
orgulhar-se de mais de seis sé descrição dos acontecimentos que
culos de existência. A despeito do aqui têm lugar, um livro que
que outros possam dizer, ela se pretendo escrever: A Vida dc
considera a metrópole da Bitínia. Constantino. Mais do que isso,
Postando-se num elevado monu sinto-me confiante de poder for
mento no centro da cidade, vo necer-lhe boa soma de fundamen
cê pode ver em baixo as largas tos para esta ocasião histórica.
avenidas que vão ter às quatro Não me será incómodo, asseguro-
portas. Ao norte é a estrada para lhe. Passei a maior parte da mi
Nicomedia, onde o nosso mui nha vida colhendo dados para uma
gracioso Imperador Romano, o história da Igreja Cristã. Mas su
grande Constantino, instalou o ponho que homens ocupados co
seu quartel-general temporário. mo você raramente têm tempo
Digo temporário por ser bem sa para ler a minha História Ecle
bido que êle está reconstruindo siástica em dez volumes. Com sua
Bizâncio, sôbre o Bósforo, para licença, pois, assinalarei alguns
ser sua capital permanente. Quan dos fatos mais salientes versan-
do Bizâncio se tornar Constanti tes sôbre esta assembléia. Se al
nopla, Nicéia estará bem situada. guém estiver interessado em ob
Ao sul você vê as muralhas que ter a completa descrição do que
se estendem até o Lago Ascânio; vai ser tão brevemente esboçado
dali um rio corre para dentro do nestas entrevistas, saberá onde
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achá-la nos meus livros. Contudo, dos, somos crucificados, somos ex
posso acrescentar, com tôda hu postos às feras, somos torturados
mildade, que, embora eu me haja com grilhões e pelo fogo e pelos
especializado na história da Igre mais terríveis tormentos” (Jus-
ja fundada por Nosso Senhor Je tino, Diálogo com Trifon, 110).
sus Cristo, não tenho monopólio Realmente, o nosso grande advo
sôbre as fontes. Há uma porção de gado africano, Tertuliano de Car-
outras autoridades nestas maté tago, pôde assim resumir a ati
rias; posso ter de vez em quando tude oficial: “Não é legal para
ocasião de me referir a algumas você o existir” (Apologeticum, 4).
delas. Contudo, isto não o impediu de
Ontcns sangrentos. Primeira lançar o desafio aos perseguido
mente deixe-me observar que esta res oficiais, dizendo: “Façam êles
é, desde o tempo dos Apóstolos, como pior puderem, pois “o san
a primeira vez, que se reúnem os gue dos cristãos é semente” (ibi-
bispos de todo o mundo cristão. (lem, 50).
Sim, desde que os Apóstolos saí Presente tranquilo. Hoje essa
ram pelo mundo a pregar o Evan predição está cumprida. Agora,
gelho a tôdas as nações não houve não somente nós cristãos podemos
reunião tal da hierarquia católi existir e reunir-nos em assem-
ca. Porque você vê que, até doze bléia aberta, como também a boa
anos atrás (313), quando o nosso vontade do Imperador muito con
mui gracioso Imperador publicou tribuiu para que isso fôsse leva- \
do a efeito, pois êle permitiu a
alguns o uso dos meios públicos r
de transporte, enquanto a outros
proporcionava amplo suprimento
de cavalos para seu transporte.
Também o lugar escolhido para
o concílio, a cidade de Nicéia na
Bitínia — chamada da Vitória
— era apropriado para a ocasião
. .. Parece evidente que todo ês-
se procedimento foi obra de Deus,
visto como homens que tinham es
tado mui largamente separados,
não só em sentimento, mas tam
bém pessoalmente, e por diferen
ça de país, lugar e nação, foram
o seu Edito de Tolerância, a aqui postos juntos e compreendi
política perseguidora da Roma Im dos dentro dos muros de uma só
perial tornava tal reunião prà- cidade. . . formando, por assim
ticamente impossível. Até então, dizer, uma vasta grinalda de sa
como disse um dos nossos filóso cerdotes, composta, de uma varie
fos cristãos, “nós somos decapita dade das mais escolhidas flores”
5
(Eusébio, Vida de Constantino,
3, 6).
Elenco episcopal. Receio que o
meu júbilo me haja traído com
uma linguagem mais florida do
que é conveniente a historiadores
sóbrios. Você estará querendo de
talhes mais prosaicos: o pessoal
desta convenção, e alguma esta
tística. Suporte-me mais uma vez
enquanto eu leio coisas tiradas
das minhas próprias notas sôbre
a cena: “Uma simples casa de
oração, embora divinamente en
grandecida, bastou para conter
imediatamente Sírios e Cilícios, Estatística. Quanto ao número
Fenícios e Árabes, delegados da dos bispos, cheguei a contar para
Palestina e outros do Egito; Te- mais de 250 (Ibid., 3, 8), embora
banos e Líbios, com os que vie meu jovem amigo o Diácono Ata-
ram da região da Mesopotâmia. násio, de Alexandria, declare que
Um bispo persa também estava há exatamente 318 (Carta aos
presente nesta conferência, nem Africanos, 2). Êsses alexandri
faltava também ao número um nos são grandes astrónomos e ma
Cita. O Ponto, a Galácia e a temáticos; devem ser bons em es
Panfília, a Capadócia, a Ásia e tatística. Mas, em aditamento aos
a Frigia forneceram os seus mais bispos, “os sacerdotes e diáconos
distintos prelados; enquanto que e a multidão de acólitos e outros
os que habitavam nos mais remo assistentes era inteiramente in
tos distritos da Trácia e da Ma- contável” (Eusébio, Vida de Cons
cedônia, da Acaia e do Epiro, tam tantino, 3, 8).
bém estavam, não obstante, presen Que contraste com a primeira
tes. Até da própria Espanha, um reunião de bispos cristãos! Per
cuja fama estava largamente di doe-me se, por alguns momentos,
fundida tomou o seu assento como eu viro as páginas da história e
um indivíduo na grande assem- lanço um olhar retrospectivo para
bléia. (Aqui estou-me referindo ao o cenáculo de Jerusalém onde os
Bispo Hósio, de Córdova, principal Apóstolos do Senhor se reuniram
representante do nosso Santo Pa depois da Ascensão dêste. O seu
dre Silvestre, de Roma, mais primeiro negócio foi escolher um
adiante mencionado). 0 Prelado sucessor para o traidor Judas Is-
da cidade imperial foi impedido cariote (At 1, 12). Porque na
de comparecer, por extrema velhi queles dias a Igreja inteira con
ce, mas os seus sacerdotes esta tava apenas algumas centenas de
vam presentes e lhe fizeram as pessoas: 120 são aqui menciona
vêzes” (Ibid., 3, 7). das nos Atos (1, 15), enquanto
6
que Paulo fala de umas 500 (1 quando Pedro e João foram pre
Cor 15, 16): Quem teria pensa sos pelo Sinédrio judeu, o pró
do que, em menos de três séculos, prio tribunal que condenara Je
essas poucas pessoas amedronta sus à morte. Durante a Paixão
das difundissem as suas idéias do Senhor, êsses mesmos Apósto
ao longo e ao largo do dilatado los haviam fugido; agora, con
Império Romano! vencidos pela Ressurreição, e tor
Razão básica para o crescimen nados eloquentes pela descida do
to. Alguém cuidou disso. E foi Espírito Santo, declaram: “Prín
Jesus Cristo, que predisse: “O cipes do povo e anciãos, se nós
Reino do Céu é como um grão de hoje somos julgados por causa
mostarda que um homem tomou do bem feito a um homem en-
e semeou no seu campo. Esta é, fêrmo, pelo modo como foi êle
em verdade, a mais pequena de curado, de todos vós e de todo
todas as sementes, mas, quando o povo de Israel seja conhecido
cresce, é maior do que tôdas as que em nome de Nosso Senhor
hortaliças, e torna-se uma árvo Jesus Cristo Nazareno, que vós
re, de tal modo que as aves do crucificastes, e que Deus ressus
a r vêm e lhe habitam nos ramos” citou dos mortos, é que êle aqui
(Mt 13, 31-32). Quero frisar is está em pé diante de vós, sãor
to: é minha honesta convicção que (At 4, 9-11).
a única explicação real, a única Embora batidos e ameaçados c
causa adequada para essa rápida morte, êsses Apóstolos persistei
difusão da Igreja Cristã é o po impávidos: “Se é justo diante dl
der de Cristo, nosso Senhor e nos Deus escutar a vós mais do que
so Deus. Ela é simplesmente um a Deus, julgai-o vós mesmos; pois
milagre — e entendo isto no sen nós não podemos deixar de falar
tido estrito dêsse têrmo estafado do que vimos e ouvimos... De
— ela só é explicada pelo poder vemos obedecer a Deus antes que
de Deus e só ao poder de Deus aos homens” (At 4, 19; 5, 29).
é atribuível. Não se pode sustar uma cora
Convicção missionário. Você gem inspirada como essa; nada
quer explicações e fatores con- pode detê-la. Todos os ulteriores
tributivos mais tangíveis. Pois perseguidores da Igreja teriam
bem: eu lhe concedo haver Cris feito bem prestando a atenção
to usado instrumentos humanos. ao que disse aquêle sábio mem
Êstes foram, antes de tudo, os bro do conselho judeu o Dr. Ga-
Apóstolos, e, depois, os sucessores maliel. O seu conselho, embora
dêstes. Todos estavam convenci desatendido, foi certo: “Se êste
dos do fato da Ressurreição de plano ou esta obra é de homens,
Cristo, e eram destemerosos em desvanecer-se-á. Mas, se é de
proclamar essa “boa-nova” a cada Deus, não sereis capazes de des
um, mesmo com risco da própria truí-la; para que não vos acheis
vida. Êsse espírito dinâmico e ês- talvez lutando mesmo contra
se entusiasmo foram evidentes Deus” (At 5, 38-39).
7
Capadócia e na Ásia, e, por fim,
vindo para Roma, foi crucificado
de cabeça para baixo, por ter
pedido sofrer deste modo. Que
precisamos dizer a respeito de
Paulo, que pregou o Evangelho
do Cristo de Jerusalém à 11iria,
e depois sofreu o martírio em
Roma sob Nero?” (Eusébio, His
tória Eclesiástica, III, 1). Hero-
des Agripa “mandou matar a es
pada Tiago, irmão de João” (At
12, 2). Josefo, o grande historia
dor judeu, diz-nos do outro Após
tolo Tiago: como os judeus, “ten
Um dos perseguidores judeus, do-o acusado, com certos outros,
Saulo, de Tarso, discípulo dêsse de lhes violar a lei, entregaram-no
mesmo Gamaliel, ainda teve de para ser lapidado” (Antiguidar
aprender duramente essa lição. des dos Judeus, 20, 9). E assim
Na estrada de Damasco, por on com os outros. Exceto João, todos
de ia para deter os cristãos, êle foram mortos por causa das suas
foi derrubado do seu cavalo por convicções, e mesmo João foi mi
intervenção divina, para ouvir lagrosamente preservado.
uma censura do seu próprio Mes Messe apostólica. E qual foi a
tre: “Saulo, Saulo, por que me messe dêsse sangue dos Apósto
persegues?” (At 9). E Saulo, o los? “Sob a influência do poder
perseguidor, tornou-se Paulo, o celeste e com a cooperação divi
na, o ensino do Salvador, como
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tanás desejou ter-vos, para vos
joeirar como trigo. Mas roguei por
ti, para que a tua fé não desfa J
leça; e tu, quando fôres conver
tido, confirma teus irmãos” (Lc
22, 31-32).
Finalmente, João nos diz como
êsses grandes podêres foram real Pedro — Bispo de Roma. Mas
mente conferidos a Simão Pedro Jerusalém não era destinada a
depois da Ressurreição de Cristo. ser o quartel-general permanente
Então Cristo, o Bom Pastor, na de Pedro. Já penetrei a fundo esta
iminência de ascender ao céu, dei questão, e os fatos são confor
xa Pedro em completo encargo do me os. registei: “Durante o rei
seu rebanho todo: “Apascenta os nado de Cláudio, a boníssima e
meus cordeiros... Apascenta as graciosíssima Providência que ve
minhas ovelhas... Apascenta as la por tôdas as coisas, levou a
minhas ovelhas” (Jo 21, 15-17). Roma Pedro, o mais forte e o
A Chefia de Pedro. Além disto, maior dos Apóstolos — e o úni
os Atos dos Apóstolos mostram co que, por causa das suas vir
Pedro tomando a iniciativa depois tudes era o intérprete de todos
da Ascensão de Cristo: em esco os o u tro s ...” (Eusébio, História,
lher um substituto para Judas II, 14). Quais são as minhas fon
Iscariote (1); em pregar o pri tes para esta importante asser
meiro sermão (2); em operar os ção? Eis aqui apenas algumas.
primeiros prodígios milagrosos Você acha Pedro falando-nos,
(3); em desafiar o Sinédrio (4, em linguagem velada, que êle está
5); em governar a comunidade em Roma: “Saúda-vos a igreja
cristã e em ordenar clérigos as que está em Babilónia, eleita jun
sistentes (5-6); em inspecionar tamente convosco” (I Ped 5, 13).
17
Naturalmente a velha persegui e ali foi martirizado com Pedro.
dora judia, Babilónia na Mesopo- João insinua outro tanto no seu
tâmia, estava então grandemente Apocalipse: “Exulta sôbre ela
em ruínas. Mas nenhum cristão (Babilónia, aliás Roma), ó céu,
convertido do judaísmo deixaria e vós santos apóstolos e profetas,
de compreender essa alusão à his pois Deus julgou o vosso julga
tória judaica: “Babilónia” aí re mento sôbre ela” (18, 20). Ao
fere-se a Roma, moderna captora mesmo tempo, na própria Roma, o
e perseguidora de judeus e cris sucessor de Pedro, Clemente, in
tãos. Isto é um elementar códi forma-nos que “as maiores e mais
go “subterrâneo”. João Evange retas colunas da Igreja foram
lista refere-se muitas vêzes a Ro
ma dêsse modo, como Babilónia.
(Apoc 14, 8; 16,19; 17, 5; 18, 21).
Certa vez êle quase deixa cair
inteiramente o véu chamando-lhe
a cidade “dos sete montes” (ibid.,
17, 9) — as sete colinas de Ro
ma, sem dúvida. Todo o modo de
falar de Pedro, e especialmente a
iua referência a uma “igreja”,
também torna claro que êle não
estava simplesmente visitando Ro
ma, mas ali estava em caráter
oficial, presumivelmente como che
fe da comunidade local.
Essa presunção é fortalecida perseguidas e mesmo combatidas
por Paulo. Antes mesmo de ter de morte. Ponhamos diante dos
visto Roma, êle protesta que não nossos olhos os bons Apóstolos. Lá
quereria “edificar sôbre funda estava Pedro, que, em razão de
mento de outro homem” (Rom 15, uma injusta inveja, suportou não
15-20). Na verdade, êle não no um, nem dois, senão muitos jul
meia êsse “outro homem”, mas gamentos, e, assim, tendo dado o
não havia necessidade de fazê-lo, seu testemunho, passou ao seu
quando a Igreja inteira sabia do designado lugar de glória” (Car
paradeiro dos principais Apósto ta aos Coríntios, 5).
los de Cristo. E a saudação de Uns setenta anos depois, o Bispo
Paulo à Igreja romana, i. é, “a Dionísio, de Corinto, escrevendo
vossa fé é anunciada no mundo para acusar o recebimento de uma
inteiro” (Rom 1, 8), pode ser uma carta do Bispo Sotero de Roma (o
oblíqua referência a êle — Pedro, duodécimo Papa), diz: “Assim,
— “cuja fé não haveria de des por essa admonição, ligastes jun
falecer” (Lc 22, 31). tas as plantações de Pedro e de
O martírio romano de Pedro. Paulo em Roma e em Corinto.
Mais tarde Paulo veio a Roma Porque ambos igualmente plan-
18
taram na nossa Corinto e nos en ria, IV, 22), e por Irineu de Lião
sinaram, e ambos igualmente en (Contra as Heresias, III, 3).
sinaram juntos na Itália e sofre Talvez, no entanto, você se per
ram o martírio ao mesmo tempo” gunte se algum dos sucessores de
(Eusébio, História, II, 25). Final- Pedro mostrou algo da chefia au
inente, há pouco mais de um sé toritária de Pedro. A êste respei
culo, Caio, um sacerdote em Ro to, note isto. Você se lembra de
quanto trabalho os Coríntios de
ram a Paulo; que linguagem for
te teve êste de usar para corrigi-
los. Pois bem: depois da morte
dêle, certa vez, durante o reinado
de Domiciano, êsses turbulentos
Coríntios revoltaram-se contra os
seus sacerdotes locais. Quem é
que deve revocá-los a um senso
dos seus deveres? Será o Após
tolo João, que ainda vive? Não:
é o sucessor de Pedro, Clemente,
o quarto Bispo de Roma (92-101).
Veja em que têrmos fortes êlf
lhes escreve: “O Beato Apóstol
ma, desafia uns pretensos turis Paulo. . . escreveu-vos a respeit
tas dizendo: “Posso mostrar-vos de si mesmo e de Cefas e de Apols
os troféus (tumbas monumentais) porque até mesmo então éreis da
dos Apóstolos, porque, se fordes dos a tumulto. . . E’ vergonhoso,
ao Vaticano ou à Via Óstia, acha meus amados, mui vergonhoso, e
reis os troféus dos que lançaram é indigno da vossa instrução em
os fundamentos desta igreja” Cristo, ouvir dizer que a estável
(Ibid. II, 25). e antiga igreja dos Coríntios, por
Sucessão de Pedro. A esta al causa de uma ou de duas pessoas,
tura, posso ver que você deduziu devesse revoltar-se contra os seus
o nexo existente entre o primado sacerdotes... Portanto, vós, que
de Pedro, fundador e primeiro lançastes o fundamento da rebe
bispo da Igreja em Roma, e o lião, submetei-vos aos sacerdotes,
fato de o presidente desta assem- e aceitai castigo para penitên
bléia em Nicéia ser Silvestre, o c ia ... Mas, se alguns desobedeces
atual Bispo de Roma e nosso ve sem às palavras que por Êle
nerável pai em Cristo. Já lhe (Cristo) foram ditas por nosso
disse que compilei uma lista inin intermédio, fiquem sabendo que se
terrupta dos bispos romanos des envolverão em não pequena trans
de Pedro. Você pode verificar as gressão e perigo, mas nós sere
fontes dos meus próprios registos mos inocente dêsse pecado... Pro
na informação fornecida por He- porcionar-nos-eis alegria e júbilo
gesipo da Síria (Eusébio, Histó se obedecerdes ao que nós escre-
19
vemos por mediação do Espírito tensão rival à chefia cristã con
S anto... Mandai-nos de voita tra o Bispo de Roma, êsse seria o
prontamente os nossos legados, Bispo de Antioquia, onde Pedro
Cláudio Efebo e Valério Vito, jun trabalhara por algum tempo. Mas,
tamente com Fortunato, em paz longe de reclamar qualquer autori
com alegria, de modo que êles pos dade sôbre a Igreja Romana, Iná
sam com presteza anunciar a paz cio mostra deferência: “Não co
e harmonia pela qual temos re mo Pedro e Paulo eu dou quais
zado e que tanto temos dese quer ordens a vós. Êles eram
jado” (Carta aos Coríntios, 47, Apóstolos; eu sou um convicto;
57, 59, 63). êles eram livres, eu até êste mo
Observe que nenhum simples mento sou um servo” (Carta aos
bispo igual em categoria ousaria Romanos, 4).
escrever tal carta a uma igreja
como Corinto, fundada por um
Apóstolo, o próprio grande Paulo
— senão tendo autoridade sôbre
a Igreja de Cristo inteira, por
sucessão a Pedro, chefe dos Após
tolos. Incidentemente, veja como
3le envia legados, tal como Silves
tre tinha feito a Nicéia. Final
mente, mesmo se pudéssemos ima
ginar o Papa Clemente usurpan
do uma autoridade que não era
sua, êle nunca teria sido obede
cido por aquêles altivos Coríntios
a não ser compreendendo êles que
a autoridade dêle era a autoridade
de Cristo, como delegada a Pedro No seu caminho para o martí
e aos seus sucessores. E sabemos rio, Inácio escreveu sete cartas.
que Clemente foi obedecido. O pos Em outras missivas êle simples
terior Bispo Dionísio de Corinto mente saúda “a igreja que está
“faz menção da carta de Clemen em Esmirna”, “a igreja que está
te aos Coríntios, mostrando que em Filadélfia”, etc.. Mas veja co
tinha sido costume desde o comê- mo seu estilo muda quando êle
ço lê-la na igreja” (Eusébio, His vem a se dirigir à Igreja Roma
tória, IV, 23). na: “À Igreja que é amada e
Reconhecimento do Primado Ro iluminada por vontade daquele
mano. Não mais de dez ou quinze que quis tôdas as coisas que exis
anos depois da advertência de Cle tem, de acordo com o amor de
mente aos Coríntios, achamos Iná Jesus Cristo Nosso Senhor, mes
cio, Bispo de Antioquia, escreven mo àquela que preside na região
do aos Romanos. Ora, se algum dos romanos, digna de Deus, dig
bispo pudesse suscitar uma pre na de honra, digna de bênção, dig-
20
na de louvor, digna de prosperi para a tradição derivada dos
dade, digna na sua pureza e pre Apóstolos daquela grande e glo
sidindo à confraternidade... ” riosa igreja fundada e organizada
(ibidcm, 1). em Roma pelos dois gloriosos
Sim, “presidindo à confratemi- Apóstolos Pedro e Paulo, c para
dade”. . . note bem estas pala a fé declarada à humanidade e
vras ! transmitida ao nosso próprio tem
Essa prerrogativa da “presi po através dos bispos dela na sua
dência” romana é repetida por sucessão. Porquanto, dessa igreja,
Irineu (por volta de 140). Já fri por causa da sua posição de co
sei anteriormente a importância mando, cada igreja, isto é, os fiéis
deste: êle era um “grão-discípulo” de tôda parte, devem necessaria
de João, o Apóstolo, familiarizado mente depender, e nela a tradição
com o ensino e prática cristãs tan que vem dos Apóstolos tem sido
to no Oriente como no Ocidente. continuamente preservada pelos
No seu tempo apareceu ali um que são de tôda p a r te ...” (Con
grupo de sabidões chamados Gnós- tra as Heresias, III, 3).
ticos que pretendiam possuir uma “Subsolo” Pétreo. Agora deve
“informação interior” sôbre as mos parar; não podemos cansá-lo
verdades cristãs, alguma ciência citando testemunha após testemu
oculta deixada a êles pelos Após nha. Se você deseja acompanhar
tolos. Refutando-os, Irineu can êstes pontos e outros em maior
sou-se da verdadeira abundância detalhe, leia a minha História.
de material que tinha a seu dis Ali, por exemplo, você achará co
por. Daí, a fim de encurtar a mo o Papa Víctor expulsou da
discussão e desfechar um golpe Igreja os bispos asiáticos por cau
de efeito, asseverou: sa da sua obstinação sôbre a ce
“Está no poder de quem quer lebração da Páscoa (5, 24); ou
que o deseje achar a verdade e como os bispos da Síria e do Egi
conhecer a tradição dos Apósto to referiram à Igreja Romana a
los, professada através do mun sua censura de Paulo de Samó-
do em cada igreja. Também so sata (7, 30). Tudo o que você
mos capazes de nomear aquêles tem a fazer é ler os documentos.
que foram designados bispos pe Quê! se vier a cogitar disso, nem
los Apóstolos nas igrejas, e os sequer precisará ler. Entre nas
seus sucessores até os nossos pró catacumbas de Roma e olhe para
prios tem pos... Mas, já que seria os desenhos que há nas paredes.
muito tedioso, num livro como ês Veja Cristo dando a Pedro um
te, repassar as linhas de suces rôlo de pergaminho com a ins
são em cada igreja, confundire crição: “O Senhor dá a lei”. Êste
mos tôdas as pessoas que, ou por e outros desenhos comparam a
mau humor ou por vanglória ou delegação de Pedro na Nova Lei
por cegueira ou por perversidade com a de Moisés sob a Antiga.
de mente, de qualquer modo se Contemple Cristo em traje de pas
coligam no êrro, apontando-lhes tor colocando um rebanho de ove-
21
lhas aos cuidados de Pedro. Des Portanto, você não precisa ler
ça à cripta vaticana, por baixo livros para ficar sabendo que Pe
da basílica. O Imperador Constan dro foi deputado de Cristo, que
tino está-se convertendo à Igreja foi o primeiro Bispo de Roma, e
de Pedro; veja os corpos de Pedro que ali foi martirizado. Túmulos
e dos seus sucessores jacentes lado e monumentos, tanto como listas
a lado. Entre no forum de Nero episcopais e testemunhos de es
sôbre a Colina Vaticana. Deite critores, afirmam que o nosso
um olhar àquele obelisco; êle fêz
sombra ao real martírio de Pe
dro no circo, “entre os postes
de meta” (Atos de Pedro, em
Barnes, Peter in Rome, p. 97).
Ou entre na nova Basílica do
Salvador perto da Porta de La-
trão, e inspecione o velho altar
de madeira preservado desde o
tempo em que Pedro oferecia o
Sacrifício Eucarístico em Roma.
Dê um passeio até o Charco da
Cabra, ao Cemitério Ostriano en
tre a Via Salaria e a Via No-
mentana. Aqui acredita-se que al
guns dos primeiros convertidos de
Pedro colocaram a'sua vivenda à venerável pai Silvestre, o trigé
disposição de Pedro. Aqui você simo terceiro Papa, sucedeu a Pe
pode ver a própria cadeira de Pe dro nas suas funções. Èle, e só êle,
dro; Tertuliano menciona-a (Pres é o verdadeiro presidente dêste
crição dos Hereges, 36). Cipria- Concílio Niceno, e, mui prazero
no chama cismáticos a todos os samente, eu e todos os bispos ca
que se opõem aos ocupantes dela tólicos cedemos a tribuna a êle e
(Carta 59, 14). aos seus representantes.
C R E D O N IC E N O :
C R JS ' r o £ D E U S
Ifi
E para que fim é esta criatura, um homem deifi-
reunião? Eu já me esta cado ou adotado como di
va perguntando o quanto vino.
demoraria fazer-me você 0 bispo de Ario e seus
esta pergunta. A resposta irmãos sacerdotes decla
parece-me ser simplesmen raram-se contra êle. Mos
m
te esta: é para provar que traram que a interpreta
a Igreja Cristã é sem ção dêle ia contra a voz
pre cristã. unânime da Escritura e
Origens Arianas. Digo da Tradição, e que ela
isto porque você deve com contradizia a voz do céu
preender que êste concí- 1 que disse: “Êste é meu Fi-
lio foi convocado em Nicéia para lho bem-amado em quem pus to
trata r de um ponto fundamental das as minhas complacências” (Mt
da doutrina cristã. A origem da 3, 17). O modo de ver de Ario
presente crise reside em Alexan também punha de lado a solene
dria. afirmação de Cristo em face da
Ali, há uns seis anos, Ario, um morte; quero dizer quando, inti
dos principais pastores da cida mado pelo Sumo Sacerdote judeu
de, contendeu com o Bispo Ale Caifás a dizer se era o Filho de
xandre sôbre a natureza de Cris Deus, êle firmemente respondeu:
to. Ora, logo desde o começo, sem “Disseste-o” (Mt 26, 63).
pre e em tôda parte, a Igreja en Essa posição que Ario assumia
sinou que não há senão um só tornava sem significação os so
Deus em três pessoas divinas: frimentos de Cristo; tornava ôcas
Pai, Filho e Espírito Santo. Êste aquelas persistentes mofas dos
ensino foi incluído na última in inimigos de Cristo: “Se és o Fi
cumbência do Mestre aos seus dis lho de Deus, desce da cruz” (Mt
cípulos, pois êle ordenou que êles 27, 40). Fazia mentirosos todos os
batizassem “em nome do Pai e do Apóstolos e mártires que traba
Filho e do Espírito Santo” (Mt lharam e morreram pela verdade
28, 20). Contudo, eis vem Ario de haver a ressurreição de Cris
pretendendo que Cristo não era to provado a sua divindade.
um Filho igual em natureza ao
seu divino P ai: donde não ser Para estar seguro, o Bispo Ale
Cristo Deus, mas meramente uma xandre expôs num concílio local,
23
as temerárias afirmações de Ario. simplesmente ser referido à Sé
Mas, uma vez que Ario buscou re Apostólica Romana, tal como a
fúgio junto ao meu homónimo o disputa coríntia o fôra ao Papa
Bispo Eusébio de Nicomedia, a Clemente, ou a Controvérsia Pas-
acusação de partidarismo poderia coal ao Papa Víctor, ou o caso do
ser fàcilmente dirigida contra o rebatismo africano ao Papa Es
Bispo Alexandre. Os de fora po têvão. E eu lhe concedo que êste
deriam sempre suspeitar que Ario seria um método seguro e um mé
era simplesmente vítima de algu todo fácil. Porém nem sempre o
ma rixa pessoal. Foi por isto que, meio mais fácil é o mais eficiente.
depois de muito falar e mesmo Se fôsse exclusivamente a ex
amotinar-se, foi julgado prudente posição da fé verdadeira que nós
reunir os bispos de todo o mundo desejássemos, certamente poderia
cristão para examinar os pontos dar-no-la o Papa Silvestre. Mas
em discussão. Sua mui graciosa conseguir que a verdadeira fé fôs
majestade o Imperador Constanti se aceita, isto já é outra coisa.
no apreciou o quanto a paz reli Como você vê, as paixões tinham
giosa contribuiria para a ordem sido excitadas; sucessos eram con
política. Daí ter sido mui coope fundidos com personalidades. As
rativo em organizar o concílio. palavras eram mal compreendidas;
por exemplo, alguns se perturba
ram com o uso do têrmo grego
“homooúsios”, ou “consubstanciai”,
em mau sentido, pelo Concílio de
Antioquia contra Paulo de Samó-
sata, há mais de cinquenta anos.
Pode êle, porém, ser usado em bom
sentido hoje, e assim o entende
rão muitos cristãos? Estas foram
algumas das graves razões por
que o Papa Silvestre julgou pru
dente dar à dificuldade ariana
plena discussão.
Porque você deveria saber que,
na Última Ceia, Cristo prometeu
Conveniência Conciliar. Mas que aos seus Apóstolos e aos suces
é isto? Por que não referir a ma sores dêstes que o Espírito San
téria inteira ao Papa Silvestre em to, o Paráclito ou Consolador, “fi
Roma? Ótima observação; de fa cará convosco sempre... ensinar-
to, é uma observação muito ani vos-á todas as coisas e vos lem
madora, pois me diz que a nossa brará tôdas as coisas que eu vos
última entrevista não foi inteira disse. . . ensinar-vos-á tôda a ver
mente vã. Sim, à primeira vista dade” (Jo 14, 17, 26; 16, 13).
pareceria que êsse desaguisado Dêste Espírito Santo é que os
ariano em Alexandria poderia Apóstolos estavam lembrados na-
24
quelc primeiro Concílio de Jeru do ou era perverso, e destarte o
salém, quando pronunciaram o seu único problema real era descobrir
veredito final: “Porque o Espíri as palavras certas para exprimir
to Santo c nós havemos decidi o ensino católico. A solução esta
d o ...” (At 15, 28). va implicitamente nas palavras
Deliberação Nicena. Assim, de de Cristo, mas tinha de ser de
pois de invocarem a guia dêsse duzida: de que modo Cristo e o
mesmo Espírito Santo, e depois Pai eram um? Ario e os seus
de concluírem as formalidades partidários diziam que êles não
inaugurais, os padres do Concílio eram o mesmo em substância ou
de Nicéia confiantemente conce natureza. Por outro lado, Alexan
deram a Ario plena licença de dre de Alexandria e o seu diáco
apresentar os seus pontos de vis no, Atanásio, contradiziam isto
ta. Êstes não mudaram substan pretendendo que Cristo era o mes
cialmente desde que êle pela pri mo em substância: “homooúsios”
meira vez os apresentou em Ale ou “consubstanciai”. Embora sen
xandria. Dia após dia êle argu do uma Pessoa divina distinta,
mentava largamente que “o Filho êle tinha a mesma natureza di
é uma criatura, formada e feita; vina que o Pai.
não é da substância do Pai”. Os Compromisso repudiado. Depois
bispos, entretanto, acharam essas de terem sido expressos êsses mo
afirmações em positiva contradi dos de ver, pensei chegado o tem
ção com a asserção de Jesus: “Eu po de entornar óleo nas águas tur
e o Pai somos um” (Jo 10, 22).
vas. De conformidade com isto,
propus um compromisso. Suponha-
se que deixemos a matéria inde
finida: digamos simplesmente que
Cristo é de natureza similar, pois
a similaridade cobre uma multi
dão de sentidos tênuemente dife
renciados.
E então aprendi uma lição que
nunca esquecerei. Compromisso po
de estar muito certo em política;
pode ser a chave para trato social;
mas trará brasas sôbre a sua ca
beça se você o propuser a respei
to da fé da Igreja Católica. Nada
pode ser mais tenaz do que essa
Igreja quando se trata de defen
Não tardou muito que uma es der o ensino divinamente revela
magadora maioria dos bispos per do recebido de Cristo. Imediata
cebesse que Ario ou estava iludi mente, em têrmos não incertos
25
foi-me dado a compreender pelos celebração da salutar festa da
meus colegas que em doutrina não Páscoa aceito por todos. Também,
pode haver palavras dúbias, não aquêles pontos que foram sancio
pode haver especulação com a nados pela resolução do corpo in
verdade depositada na Igreja co teiro foram confiados à escrita,
mo num banco por Cristo, o Mestre. e receberam a assinatura do ca
Cristo era da mesma natureza que da membro. Então o Imperador,
o Pai; assim o dissera êle; assim acreditando haver assim obtido
o haviam ensinado os Apóstolos; uma segunda vitória sôbre o ad
assim fôra transmitido; assim a versário da Igreja, resolveu cele
Igreja Católica crê neste ano de brar uma festa triunfal em hon
325; assim crerá até que Cristo ra de Deus” (Eusébio, Vida de
volte em glória para julgar o Constantino, III, 14). A decisão
mundo. sôbre a Páscoa é: “Pelo unânime
Unidade de Fé. Sôbre tal pon juízo de todos foi decidido que a
to de doutrina, portanto, não po santíssima festa da Páscoa deve
deria haver diferença de crença ser celebrada em tôda parte num
na Igreja Católica. Agir de ou só e mesmo dia” (ibidèm, III, 19).
tro modo seria repudiar o próprio O Credo Niceno. Para que a
Cristo, que rogara a seu Pai: Fé Católica de Cristo seja pre
“Pai santo, guarda em teu nome servada sem mudança contra fu
aquêles que me deste, para que turos imitadores de Ario, os Pa
êles sejam um como nós somos dres nicenos redigiram uma fór
um ... A glória que me deste dei- mula de crença, um credo. Folgo
a a êles, para que êles sejam de poder fornecer-lhe o texto ofi
um como nós somos um: eu nê- cial; é como segue:
les e tu em mim, para que êles “Cremos num só Deus, o Pai
sejam consumados na unidade, e Onipotente, Criador de tôdas as
para que o mundo conheça que tu coisas visíveis e invisíveis; e num
me enviaste” (Jo 17, 11, 22). só Senhor Jesus Cristo, Filho de
A prece de Cristo pela uni Deus, Filho Unigénito do Pai, isto
dade certamente prevaleceu em é, da substância do Pai; Deus de
Nicéia, o “Concílio da Vitória”, Deus, luz de luz, verdadeiro Deus
por uma dupla razão. Todos os do verdadeiro Deus, gerado, não
bispos, exceto cinco, sinceramen feito, consubstanciai com o Pai,
te subscreveram o inflexível dog por meio do qual tôdas as coi
ma do “homooúsios”: consubstan- sas foram feitas tanto no céu
cialidade do Pai com o Filho. As como na terra; o qual por nós
sim, sucedeu que, como estou para homens e pela nossa salvação
inserir na minha próxima Vida desceu (dos céus) e se encar
de Constantino, “o resultado foi nou, e se fêz homem; padeceu, e
não somente terem êles estado ressuscitou ao terceiro dia; subiu
unidos no tocante à fé, mas tam aos céus e virá a julgar os vivos
bém haver sido o tempo para a e os mortos; e no Espírito Santo.
26 /
Os que dizem: houve um tempo lho de Deus c criado ou é sus-
em que êle não existia, e que êle ceptível de mudança ou altera
não existia antes de ter sido ge ção, (êsses) a Igreja Católica e
rado, e que êle foi feito do nada; Apostólica anatematiza” (H. J.
ou que dizem que êle é de outra Schroeder, Decretos Disciplinares
hipóstase ou de outra substância dos Concílios Gerais, p. 16).
(que não a do Pai), ou que o Fi
liniDflDt D£ f£...
fIDELIDflDE M SUfl TRADIÇÃO
Estabilidade básica. O vam essas coisas à escri
que eu lhe dei na nossa ta, não como por êles mes
última entrevista não fo mos descobertas, mas sim
ram “novidades” no sen como a mesma coisa que
tido ordinário do têrmo. os Apóstolos haviam en
O que eu quero dizer é que sinado” (Atanásio, Sôbre
o Credo Niceno não diz os Sínodos, 5).
nada que a Igreja Cató Estas duas idéias, uni
lica não tenha crido des dade de fé e fidelidade de
de o começo. Tudo o que tradição, estão estreita
ela faz é reafirmar a sua mente ligadas. Porquan
crença em linguagem cla to não é só hoje que a
ra, precisa, inequívoca. Garan Igreja Católica é unida na pro
to-lhe que a Igreja estará re fissão comum do Credo de Nicéia;
citando êsse credo daqui a cem, se você me seguir para trás até os
mil ou mesmo mais anos. Talvez Apóstolos, descobrirá que a Igreja
que ulteriores explicações ou es é universal tanto no tempo como
clarecimentos tenham de ser adi na extensão.
tados, se novos mal-entendidos Fidelidade de transyyiissão. A
surgirem, mas nunca qualquer coi esta fidelidade em transmitir os
sa incluída no Credo em Nicéia ensinamentos de Cristo e dos
será afastada. Desta Nova Lei de Apóstolos nós chamamos tradição.
Cristo “nem um jota ou um ápice Irineu de Lião, de quem já falei
desaparecerá. . . até que tôdas as antes, tem uma expressão viva e
coisas se cumpram” (Mt 5, 18). familiar que pode exprimir mais
Porque, conforme o formulou do que qualquer têrmo abstrato.
o meu jovem amigo e co-obser- Irineu concebe a verdade cristã
vador deste Concílio o Diácono como confiada à Igreja para sal
Atanásio, “Os Padres em Ni
céia... nunca disseram relativa vaguarda: “Não é necessário bus
mente à fé: “é decretado”, mas: car entre os outros a verdade que
“assim crê a Igreja Católica”; e, é fácil obter da Igreja, de vez que
ao mesmo tempo que declaravam os Apóstolos, como um homem ri
o que criam, declaravam que is co que deposita dinheiro num ban
so não era inovação recente, mas co, lhes puseram nas mãos mui
sim doutrina apostólica. E confia copiosamente tôdas as coisas per
28
tinentes à verdade” (Contra as todos os dias até à consumação
Heresias, III, 4). dos séculos” (Mt 28, 29).
Desempenhemos o papel de ins Concilio de Jerusalém. Natural
petores de banco, e inquiramos se, é, pois, que unidade de fé e fi
no decurso de três séculos, os delidade de transmissão fôssem
mestres cristãos foram cônscios claramente manifestadas quando
do seu sagrado depósito. os Apóstolos se reuniram no pri
meiro concílio eclesiástico em Je
Segurança de Cristo. Já recor rusalém. Ali, “alguns da seita dos
dei a prece do Mestre pela uni Fariseus” que haviam aceitado a
dade por ocasião da Última Ceia. fé cristã levantaram-se e disse
Mas nessa ocasião êle também as ram: “Êles devem ser circunci
segurou ao depósito cristão a pro dados e também mandados obser
teção permanente do Espírito San var a Lei de Moisés” (At 15, 5).
to: “Rogarei ao Pai, e êle vos Mas não conseguiram mudar o
dará outro Advogado para ficar ensino tão recentemente recebido
convosco para sempre, o Espírito de Cristo. “Pedro levantou-se e
de Verdade, que o mundo não lhes disse: “Irmãos, sabeis que
pode receber, porque nem o vê nos dias passados ordenou Deus
nem o conhece. Mas vós o co entre nós que por minha bôca os
nhecereis, porque êle ficará con Gentios ouvissem a palavra do
vosco e estará em vós... O Ad Evangelho e cressem. E Deus, que
vogado, o Espírito Santo que o conhece os corações, declarou-se
Pai enviará em meu nome, ensi- por êles, dando-lhes o Espírito
nar-vos-á tôdas as coisas e vos Santo tal como o fêz conosco; e
lembrará tudo o que eu vos dis não fêz distinção entre nós e êles,
s e ... Quando vier o Advogado mas, purificou-lhes os corações pe
que eu vos enviarei do Pai, o Es la fé. Por que, pois, procurais ago
pírito de Verdade que procede do ra tentar a Deus pondo na cerviz
Pai, êle dará testemunho de dos discípulos um jugo que nem
m im ... Quando êle, o Espírito de nossos pais nem nós pudemos su
Verdade, vier, ensinar-vos-á tôda a portar? Mas nós cremos que so
verdade...” (Jo 14, 16-17, 26; mos salvos pela graça do Senhor
16, 13). Jesus, tal como o são êles” (At
Os Atos dos Apóstolos (2) re 15, 7-11).
latam o cumprimento dessa pro Note-se, pois, a unanimidade da
messa no Pentecostes, quando os Igreja em preservar a tradição
Apóstolos “foram cheios do Es cristã: “Então a assembléia in
pírito Santo e começaram a falar teira se calou. . . Então os Após
várias línguas, conforme o Es tolos e sacerdotes com a Igreja
pírito Santo lhes dava de fala tôda decidiram escolher represen
rem” (2, 4). Sem dúvida, a vinda tantes . . . porque ao Espírito San
do Espírito não quis dizer deser to e a nós pareceu bem não lan
ção de Cristo; embora invisível, çar outros encargos sôbre vós.. . ”
diz-nos êste, “eu estou convosco (At 15, 12, 22, 28).
29
Solicitude Apostólica. 0 cuida Precaução tal fêz os Apóstolos
do escrupuloso com que os pri e os seus discípulos entenderem
meiros dirigentes da Igreja evi que não podiam nem sequer con
tavam qualquer pessoa ou qual versar com qualquer daqueles que
quer coisa que pudesse pôr em pervertiam a verdade; conforme
perigo a fé é ilustrado por esta Paulo também disse: “Um homem
anedota: “O Apóstolo João entrou herege, depois de uma primeira
certa vez numa casa de banhos e de uma segunda admoestação,
para se banhar; mas, sabendo evitai-o” (Tito 3, 10, citado por
que Cerinto (o herege Milenário) Eusébio, História, IV, 14).
estava lá dentro, pulou fora do Docilidade dos fiéis. Mas tal
lugar e correu para fora da por vez você pense que era só a hie
ta, por não poder suportar ficar rarquia ou corpo dirigente da
sob o mesmo teto com êle. E Igreja que mostrava êsse cuidado
aconselhou os que com êle esta pela tradição. Somos felizes de
vam a fazerem o mesmo, dizendo: ter uma espécie de manual ou li
“Fujamos, antes que a casa de vro de oração para os leigos fiéis,
banhos caia; pois Cerinto, o ini compilado, cremos, dentro de um
migo da verdade, está lá dentro” século depois da Ressurreição do
(Eusébio, História, III, 28). Apa Senhor. Traz êle o significativo
rentemente, esta lição causou título: Ensino do Senhor por in
grande impressão no discípulo de termédio dos Doze Apóstolos, em
João, Policarpo, pois outra histó bora muito mais frequentemente
ria é relatada dizendo que “o pró se lhe faça referência sob o seu
prio Policarpo, quando Marcion curto título grego, ou seja como
(o herege Gnóstico) certa vez en- a Didaché.
controu-se com êle e disse: “Re Abra êsse livrinho quase ao
conheces-nos”? êle respondeu: “Re acaso e veja como êle considera al
conheço o primogénito de Sata tamente êsse depósito sagrado da
nás”. fé cristã: “Meu filho, dia e noi
te guardai na memória aquêle
que vos fala a palavra de Deus;
honrá-lo-eis como ao Senhor, pois
o Senhor está onde quer que o
ensino do Senhor é pregado...
Não desejeis nenhum cism a...
Não abandoneis os mandamentos
do Senhor, mas guardai aquilo
que recebestes, sem acrescentar
ou subtrair... Tomai cuidado de
que ninguém vos desvie do cami
nho do Ensino, de vez que êsse
ensino seria sem D eus... Por
tanto, se alguém vier a vós e vos
ensinar tôdas as coisas sobredi-
30
tas, recebei-o; mas, se uma má ja Católica o direito de prescri
pessoa vier e ensinar outra dou ção à verdade religiosa: Os
trina para contradizer essa, não Apóstolos “pregaram aquilo que
a escuteis” (Didaché, 4, 6, 11). Cristo lhes revelou, c isto que
Continuidade da Tradição. E eu prescrevo não deve ser pro
assim a achará você sempre atra vado de outro modo a não ser
vés dos anos cristãos. Deixe-me através das mesmas igrejas que
dirigir a orquestra cristã desde os Apóstolos fundaram pregan
tôdas as partes do mundo cató do-lhes viva voce, como dizem
lico. Hegesipo da Palestina fêz êles, e mais tarde mediante car
uma peregrinação a Roma no tem tas. Já que estas coisas assim
po do Papa Aniceto (c. 160); são, é claro que deve ser consi
em caminho “encontrou-se com derada verdadeira tôda doutrina
muitíssimos bispos, e de todos que concorde com essas igrejas
êles recebeu a mesma doutrina. apostólicas, raízes e originais da
Convém ouvir o que êle diz: fé, sustentando certamente aqui
. . . “Em tôda a sucessão (dos lo que as igrejas receberam dos
bispos) e em tôdas as cidades Apóstolos, que os Apóstolos re
é observado aquilo que é prega ceberam de Cristo, e Cristo re
do pela Lei e pelos Profetas e cebeu de Deus; e deve ser con
pelo Senhor” (Hegesipo, Memó vencida de mentira tôda doutri
rias, citado por Eusébio, Histó na que ensina contra a verdade
ria, IV, 21). das igrejas e dos Apóstolos e
Outro peregrino ido a Roma de Cristo e de Deus” (Prescri
apenas alguns anos mais tarde, ção dos Hereges, 21).
ou fôsse Irineu da Gália, afir Vitória sôbre o racionalismo.
ma: “Conhecimento verdadeiro Enquanto Tertuliano desafiava
é o ensino dos Apóstolos e a a perseguição dos oficiais civis
antiga constituição da Igreja no em Cartago na África, uma uni
mundo inteiro, e a manifestação versidade cristã era estabelecida
distintiva do corpo de Cristo acor em Alexandria, no Egito. Saben
de com a sucessão dos bispos pe do como os filósofos clássicos
la qual êles transmitiram essa gregos arrazoavam os antigos mi
Igreja que existe em todos os tos religiosos, você poderia espe
lugares e que chegou até nós, sen rar que talvez a tradição cris
do guardada e preservada, sem tã não suportasse o exame da
qualquer forjamento de Escri erudição profunda. Mas não;
turas, por um completíssimo sis porque, com tôda a sua insistên
tema de doutrina, e não rece cia pela mais alta instrução e pe
bendo nem adição nem encurta las abstrações filosóficas, o mes
mento, e sendo lido sem falsifi tre alexandrino Clemente (150)
cação” (Contra as heresias IV, previne: “De modo algum deve
33). mos transgredir a regra da Igre
Da África, Tertuliano (circa j a . .. Uma vez que a estrada real
150-160) reivindica para a Igre é uma só, e há muitos outros ca-
31
minhos, dos quais alguns levam seus relaxados sequazes e do
ao precipício e outros a uma tor outro estava o antipapa Novacia-
rente impetuosa, e outros a um no em Roma. Contra todos êsses
mar profundo, use-se a estrada Cipriano diz: “A esposa de Cris
real, antiga e livre de perigo... to não pode ser uma adúltera;
Em origem e em preeminência di é incorrupta e c a sta ... Preser
zemos que a Igreja antiga e ca va-nos para Deus; assinala os
tólica é única, congregando, co filhos que ela gera para o rei
mo congrega, os homens na uni no. Quem quer que esteja separa
dade de uma só fé” (Stromata, do da Igreja está unido a uma
VII, 15, 17). adúltera, está separado das pro
E nem isto é a mera opinião messas da Igreja, e aquêle que
pessoal de um conservador. O su deixa a Igreja de Cristo não vem
cessor de Clemente como reitor às promessas de Cristo. Não po
da escola alexandrina, o incompa de ter a Deus por pai quem não
rável Orígenes (185), era um pen tem por mãe a Igreja” (Sôbre a
sador tão ousado como o mundo Unidade da Igreja, 6). Não é,
ainda não viu — e de fato, por um pois, surpreendente que Cipriano
tempo estêve sob censura do seu concluísse dizendo que “Novacia-
bispo. Contudo, sôbre os princípios no não é um bispo na Igreja, nem
fundamentais Orígenes nunca va pode ser computado como tal, por
cila. No próprio prólogo de uma que, desrespeitando a tradição
obra em que de boa-fé comete vá evangélica e apostólica, a nenhum
rios erros particulares, êle estabele sucedeu, mas partiu de si mes
ce um princípio: “Já que há mui mo” (Carta 69). E isto resumiu
tos que pensam sustentar as opi tudo: “Quem quer-que êle seja e
niões de Cristo, e, no entanto, al o que quer que seja, não é cristão
guns dêsses pensam diferente aquêle que não está na Igreja de
mente dos seus predecessores, con Cristo” (Carta 55).
tudo ainda está preservado o en Respeito Niceno pela Tradição.
sino da Igreja, transmitido em Não deveria, pois, constituir sur-
sucessão ordeira desde os Após prêsa acharmos os bispos em Ni
tolos e permanecido nas igrejas céia sempre lembrados da tradi
até o presente dia, ensino que diz ção, mesmo nas leis disciplinares.
só dever ser aceito como verdade Queira notar um pouco frases co
aquilo que a nenhum respeito di mo estas: “é um sábio dizer do
verge da tradição eclesiástica e
apostólica...” (Sôbre os Princí Apóstolo” (cânone 2); “adira-se
pios, Prólogo, 2, 3). estritamente ao antigo costume
Resistência ao cisma. Por ês que vige no Egito, de vez que êste
se mesmo tempo, Cipriano, o Már é também o costume do Bispo de
tir (circa 210), Bispo de Carta- Roma” (cânone 6); “uma vez
go, estava contendendo contra que o costume e a antiga tradi
cismáticos rivais. De um lado es ção mostram” (cânone 7); “rela
tavam Novato de Cartago e os tivamente aos que morrem, a an-
32
tiga lei canónica continuará a ser pósito, que devemos guardar em
observada” (cânone 13). segurança, e não desperdiçar pela
Não serão, pois, êles que violem especulação. Nós Padres em Ni
a injunção de Paulo: “Se alguém céia somos bispos: bispos ou vi
vos pregar um Evangelho outro gias. Nossa é a responsabilidade
que aquêle que recebestes, seja de guardar êste depósito da fé
anátema” (Gál 1, 8). Nós, bispos para gerações ainda não nascidas.
em Nicéia, quase a uma só voz, Ontem, hoje, amanhã, Cristo é
havemos reafirmado, contra Ario, para nós “o Alfa e o Omega, o
que Cristo é Deus. Se Cristo é princípio e o fim ... é Aquêle que
Deus, então o seu ensino é divino; é, e Aquêle que era, e Aquêle que
é um precioso legado, um rico de virá, o Onipotente” (Apoc 1, 8).
33
"Lembranças "Cristãs
...il Eucaristia
Devo dizer-lhe que os das, e pelo meio dêstes os
bispos católicos em Nicéia homens de Deus avança
são homens pobres. Muito vam sem mêdo para o in
da propriedade da Igreja terior dos aposentos im-'
confiscado durante a re periais, em alguns dos
cente perseguição pelos su quais estavam à mesa os
cessivos Imperadores Ro próprios companheiros do
manos foi-se para sempre. Imperador, enquanto ou
Do que resta, somos agora tros estavam reclinados
não os donos, mas apenas em leitos dispostos de ca
os mordomos para os cris da lado. Poder-se-ia pen
tãos pobres. Com os nossos sar que uma imagem do
próprios recursos, portanto não reino de Cristo era assim repre
poderíamos atender a convenções sentada, e um sonho antes que
seculares, proporcionando entrete realidade. Após a celebração des
nimento e “lembranças”. sa brilhante festa, o Imperador
“Lembranças” imperiais. Mas, cortêsmente recebeu todos os seus
conforme escreverei mais tarde hóspedes, e generosamente aumen
na sua Vida, o Imperador Cons tou os favores que já outorgara,
tantino mui generosamente supriu presenteando pessoalmente com
até mesmo esta deficiência. Tor dádivas cada indivíduo de acordo
nou certo que não nos faltariam com a sua condição. . . O Impe
êsses pobres prazeres que esta vi rador também mandou que amplas
da proporciona. “O próprio Im dádivas de dinheiro fossem outor
perador convidou e recepcionou gadas a todo o povo, tanto no
aquêles ministros que êle havia campo como nas cidades, compra
congregado, e, por assim dizer, zendo-se assim em honrar a fes
assim ofereceu por meio dêles um tiva ocasião do vigésimo aniver
conveniente sacrifício a Deus. Ne sário do seu reinado” (Eusébio,
nhum dos bispos faltou ao ban Vida de Constantino, III, 15, 16,
quete imperial, cujas circunstân 22 ) .
cias foram esplêndidas acima de “Lembranças” cristãs. Você po
qualquer descrição. Destacamentos de pensar que nós bispos nos es
do corpo-da-guarda e outras tro- tamos movendo em círculos eleva
pas circundavam a entrada do dos, realmente, jantando à mesa
palácio com espadas desembainha do Imperador. Mas nossos prede
84
cessores, os Apóstolos, foram ain te redentora são por Êle aplicados
d a mais favorecidos. Se Constan a geração sôbre geração de crentes.
tin o , como um governante sábio Poderia explicar como essa vida so
e benevolente, cuidou de propor brenatural cristã, tal como a vida
cionar aos bispos em Nicéia um natural de cada um, tem de nas
banquete e “lembranças”, se dese cer pelo Batismo (Jo 3, 5; Di-
jo u que o aniversário fôsse por daché, 7); tem de ser fortalecida
todos observado, não deveria sur pela Confirmação (At 8, 15; Hi-
preender-nos que Cristo, Rei do pólito, Tradição Apostólica); ali
c é u e da terra, não fizesse menos. mentada pela Eucaristia (Jo 6,
Também êle preparou um ban 54; Inácio, Esmímios, 8); cura
q u ete para os seus Apóstolos. da pela Penitência (Jo 20, 23;
■Também cuidou de que a memó Didaché, 4, 14), e por uma Ex
r i a dêsse banquete perdurasse em trema-Unção na morte (Tgo 5, 14;
celebrações aniversárias, dizendo: Orígenes, Homília II sôbre o Le-
“ Fazei isto em memória de mim” vítico); e como o poder de ad
(L c 22, 19); cuidou de que essa ministrar êsses sacramentos deve
fe s ta recebesse publicidade mun ser conferido pela Ordem (I Tim
d ial, de modo que, “do nascer do 4, 14; Hipólito, Tradição Apostó
sol ao ocaso, meu Nome seja gran lica) ; e como novas pessoas são
d e entre as gentes e em cada lu geradas em Matrimónio “de acôr
g a r haja sacrifício e seja ofereci do com o Senhor, e não meramen
d a ao meu Nome uma oblação te por lascívia” (Inácio de An
p u ra ” (Mal 1, 10). tioquia, Carta a Policarpo, 5).
SacHfício Euca/rístico. Mas não
há tempo! Uma só entrevista nun
ca poderia começar sequer a des
crever sete sacramentos. Por for
ça cingir-me-ei a um só sacramen
to, o maior, nisso que êle contém
o Autor dos sacramentos. Refiro-
me ao Sacrifício Eucarístico ins
tituído por Cristo na Última Ceia.
Lucas dá-nos a parte essencial
dêste rito: “Tendo tomado pão,
êle deu graças e partiu-o, e deu-
o a êles dizendo: “Isto é meu
Corpo, que é dado por vós; fazei
Sete "lembranças”. Se tivesse isto em memória de mim”. Se
tempo, eu poderia mostrar que melhantemente, tomou o cálice
Cristo deixou sete grandes “lem após a ceia, dizendo: “Êste é o
branças” da sua Paixão — nós lhes nôvo testamento em meu Sangue,
chamamos sacramentos — median que será derramado por amor de
te as quais os méritos da sua mor vós” (Lc 22, 19-20).
35
Note que Cristo chama clara sos ritos pascais da Lei Mosaica.
mente a êsse abençoado pão seu Embora êstes últimos não estives
corpo; o vinho consagrado é cha sem fora de moda para os cris
mado seu sangue, e não o repre tãos, êstes naturalmente quiseram
senta. Estamos face a face com substituí-lo por certas petições
aquilo a que os Judeus chamavam preparatórias. Certamente, a Ora
um “duro dizer” (Jo 6, 62), a pre ção Dominical, por nós chamada
tensão de Cristo de converter pão o “Pai-Nosso”, era natural para
e vinho em seu corpo e em seu êsse fim; você a acha recomen
sangue. Não me proponho arguir dada na Didaché (8). Ademais, os
êste ponto, porque àqueles que crentes devotos queriam agrade
crêem que Cristo é Deus êle não cer a Deus após o sacrifício e a
apresenta dificuldade de qualquer comunhão que se seguia. A Di
sorte; para os que não crêem, re daché, talvez apenas um meio-sé
ceio que qualquer coisa que eu dis culo depois da Última Ceia, dá-nos
sesse brevemente fôsse inadequa muitas dessas orações. Não posso
da. Sou um historiador antes que mencioná-las tôdas, mas note co
um teólogo; tudo o que eu propo mo a seguinte atende ao ponto
nho fazer é relatar aquilo que até básico do alimento divino dos ho
o tempo presente a tradição cris mens: “Deus Onipotente, criaste
tã tem sustentado acêrca da na tôdas as coisas por amor do teu
tureza do Sacrifício Eucarístico. nome. Deste comida e bebida aos
Eucaristia Apostólica. Certa homens para regozijo, para que
mente o respeitado mestre de Lu êles possam dar-te graças, e deste
cas, Paulo de Tarso, tomou as pa graciosamente comida e bebida es
lavras do Senhor no seu valor li piritual e vida eterna por inter
teral; adverte aquêles turbulentos médio de teu Servo (Cristo)”
Coríntios de que “todo aquêle que (Didaché, 10).
comer êsse pão ou beber êsse cá E nem êsse sacrifício eucarís
lice do Senhor indignamente será tico, nos tempos apostólicos, era
réu do corpo e do sangue do Se mera cerimónia optativa. Veja
nhor” (1 Cor 11, 27). com que indignação Inácio de
A Didaché recomenda o uso se Antioquia denuncia os hereges
manal dos sacramentos da Peni Docetas que negavam que Cristo
tência e da Eucaristia: “No Dia tinha um corpo real: “Da Euca
do Senhor reuni-vos e parti o pão ristia e da oração êles ficam lon
e oferecei a Eucaristia, tendo an ge, porque não confessam que a
tes confessado as vossas trans Eucaristia é a Carne de nosso
gressões, para que o vosso sacri Salvador Jesus Cristo que pade
fício seja puro” (Didaché, 14). ceu pelos nossos pecados, e a
Já os cristãos começaram a cer quem o Pai, na sua misericórdia,
car o rito eucarístico de orações ressuscitou dos mortos. E assim
e hinos. O próprio Cristo só pas os que discutem o dom de Deus
sou a consagrar a Eucaristia de perecem na sua contenda” (Ca/rta
pois de haver celebrado os exten aos Esmímios, 7). Pelo contrário,
86
mo dia”. Primeiramente os adora
dores ouvem leituras do Velho
e do Nôvo Testamento: “os es
critos dos Profetas ou as memó
rias dos Apóstolos são lidas quan
do há tempo”. Então o bispo, que
para os pagãos Justino identifica
como “presidente dos irmãos”,
profere um sermão, advertindo
todos de “imitarem tais exemplos
de virtude”. Depois disto, “nós
todos nos levantamos juntos e ofe
recemos as nossas orações”. Se
guem-se depois providências pre
paratórias para o sacrifício: “Pão
os bons cristãos são intimados a e um cálice contendo vinho mis
“esforçar-se para s e reunirem turado com água são apresentados
mais freqiientemente a fim de ce ao que preside aos irmãos. Êst«
lebrarem a Eucaristia de Deus e os toma e . .. recita extensas ora
oferecerem oração. . . e partirem ções de ações de graças”, — voc
o mesmo Pão, que é o remédio se lembra da da Didaché. Enquan
da imortalidade, o antídoto con to isso, “os ricos, se lhes apraz,
tra a morte, e é a vida eterna contribuem com o que desejam, e
em Jesus Cristo” (Carta aos Efé- a coleta é colocada sob a guarda
sios, 13, 20). do presidente”, para que êle “tome
Rito Eucarístico. Escrevendo há cuidado de todos os que estão na
cerca de cento e cinquenta anos, necessidade”.
Justino (circa 100-110), o Filóso Quando o ato central do sacri
fo, procurou ajudar seus compa fício se aproxima, veja como Jus
nheiros cristãos em Roma. Na es tino recorre à tradição apostólica:
perança de que as autoridades im “Os Apóstolos, nas suas memó
periais mitigassem a perseguição rias, que são chamadas Evange
se compreendessem direito o culto lhos, transmitiram o que Jesus
cristão, Justino escreveu duas lhes ordenou fazerem: que êle to
Apologias. Na primeira, depois de mou pão e, após dar graças, disse:
explicar o rito batismal, êle dá “Fazei isto em memória de mim;
uma descrição detalhada do sa isto é meu Corpo”. Semelhante
crifício Eucarístico do seu tem mente, tomou também o cálice, deu
po (Apologia I, 65-67): “No dia graças e disse: “Isto é meu san
que é chamado Domingo nós te gue”, e só a êles o deu”. Assim
mos uma assembleia comum de como o bispo imitou Cristo nesse
todos os que vivem nas cidades ato de consagração, assim também
ou nos distritos de fo ra ... por imita-o em distribuir o alimento
que nosso Salvador Jesus Cristo espiritual: “Quando o que presi
ressurgiu dos mortos nesse mes de acabou de celebrar a Eucaris-
37
tia, aquêles a quem nós chamamos cialmente clara pela instrução de
diáconos permitem a cada um dos Orígenes aos fiéis leigos que re
presentes participar do Pão eu cebiam a comunhão: “Vós que
carístico . . . Os Elementos euca costumais estar presentes aos Di
rísticos são distribuídos e consu vinos Mistérios sabeis que, quando
midos pelos presentes, e aos que recebeis o Corpo do Senhor, de
estão ausentes são enviados, por veis tratá-lo com todo cuidado e
intermédio dos diáconos”. reverência, para que não suceda
Uns setenta anos mais tarde cair um fragmento dêle, para que
podemos examinar o sacrifício eu não se perca alguma porção do
carístico para ver se teve lugar Dom consagrado. Porquanto vos
nêle alguma alteração básica. Hi- credes culpados — e o credes cer
pólito (circa 170-175), sacerdo to — se alguma coisa cair por ne
te romano, compôs um manual li- gligência nossa” (Homília X III:
túrgico, Tradição Apostólica, que Sôbre o Êxodo, 3). Porém a real
descreve alguns novos detalhes e celebração do Sacrifício, diz pelo
cerimónias, porém mais uma vez mesmo tempo Cipriano de Car-
inclui o rito essencial que remon tago (circa 210), é confinada aos
ta à ação de Cristo na Última sacerdotes: “Se o próprio Jesus
Ceia. Cristo Nosso Senhor e Deus é o
Assim achamos a Tradição sumo sacerdote de Deus Pai e se
Apostólica relembrando-nos que se ofereceu em sacrifício a seu
Cristo, “tomando pão, deu gra Pai, e mandou que isto fôsse feito
ças a Ti e disse: “Tomai e co em memória de si, então desem
mei; isto é meu Corpo, que será penha verdadeiramente o ofício de
quebrantado por amor de vós; Cristo o sacerdote que imita o que
sempre que isto fizerdes, fá-lo-eis Cristo fêz, e agora oferece o ver
em memória de mim”. Portanto, dadeiro e perfeito Sacrifício na
em memória da sua morte e res Igreja a Deus Pai” (Carta 63).
surreição nós te oferecemos êste Monumentos eucarísticos. Mas
pão e êste cálice, dando-te graças nem tôda evidência da Eucaristia
por nos teres feito dignos de fi há de ser achada em documentos.
car na tua presença e de minis Se você conhecer a chave, poderá
trar a t i . . . ” Hipólito refere ou descobrir nos monumentos cristãos
tros detalhes: o diácono traz o pão muitas referências ao Cristo Eu
e o cálice ao bispo; água é .mis carístico.
turada com o vinho; é dado o
ósculo de paz. O bispo parte em Durante os dias de perseguição,
pedaços o Pão eucarístico e, com os cristãos muitas vêzes usavam
os sacerdotes, distribui-o ao povo, um peixe como símbolo de Cris
dizendo: “O pão celeste em Cris to. Você deve saber que a pala
to Jesus” (Tradição Apostólica: vra grega para peixe é “ichthus”.
Missa de sagração episcopal). Os cristãos usavam-lhe as letras
Reverência pela Eucaristia. Já iniciais para representarem: “Ie-
evidente, essa reverência é espe sus Christòs Theou Huiòs, Sotér” ;
38
isto c: “Jesus Cristo, Filho de com leite, e êste leite... é o corpo
Deus, Salvador”. de Cristo” (Pedagogo, 1, 7).
De nôvo, na catacumba de Pris
Tendo isto em mente, leia al cila — provavelmente um dos pri
guns epitáfios de cristãos devotos, meiros convertidos de Pedro —
tais como Abercius deixou em você achará aquilo que, pelas suas
Hierápolis, na Frigia, e de Pec- inscrições, é conhecido como a Ca
tório erigido em Autun na Gália. pela Grega. Aí está uma pintura
Esta última inscrição assim po simbólica a que os latinos chamam
deria ser traduzida: “Divina pro “Fractio Panis” : a fração do Pão.
le do Peixe celeste, preservai um Sete pessoas estão sentadas a uma
coração reverente quando tomar
des a bebida da imortalidade que longa mesa onde estão dois peixes,
é dada entre os mortais. Confor cinco pães e um cálice. Um ho
tai vossa alma, ó amados, com as mem venerando, evidentemente o
fontes inefáveis, nas inexauríveis presidente da festa como o diria
fontes da Sabedoria, dadoras de nosso amigo Justino, está pondo
riqueza. Tomai o melígeno alimen as mãos sôbre os objetos que es
to do Salvador de santos, e comei- tão na mesa. Sem dúvida, os cinco
pães e os dois peixes sugerem o
o com fome, segurando nas mãos milagre de Cristo da multiplica
o Peixe. Enchei-me do Peixe, ro ção (Mt 14). Mas, enquanto o de
go-vos, Senhor Salvador. D um a senho relembra o poder milagro
bem minha mãe, rogo-vos, Luz dos so de Cristo, dirige-o a outro fim.
mortos. Aschandius, meu pai, ama- Para uma representação do mila
díssimo do meu coração, com mi gre dos pães e dos peixes, mesa,
nha doce mãe e meus irmãos, lem banquete e taça seriam desneces
brai-vos do vosso Pectório na paz sários. Essa reunião, portanto, re
do Peixe” (Bettenson, Henry, presenta um sacrifício eucarístico
Documents o f the Christian celebrado por um bispo — e os
p. 121). cristãos naqueles dias prontamen
Agora vá a Roma, desça à ca te o reconheceriam como tal.
tacumba da Beata Domitila. Ali Mas eis que aqui lhe estou for
achará desenhos do Cordeiro de necendo um livro-guia para o sub
Deus ou do Bom Pastor, trazendo solo cristão! Não o farei mais,
um balde de leite. Note que um asseguro-lhe. Bastante já foi fei
halo circunda o leite, pondo em to para seguir a Eucaristia desde
luz a natureza sagrada deste. O a Última Ceia até o Concílio em
significado desta pintura é que Nicéia. Melhor entenderá você
Cristo, sob os símbolos do Cor como o Culto Eucarístico é o
deiro de Deus ou do Bom Pastor, coração da liturgia cristã. E,
está dando ao seu rebanho o ali se você aceita a tradicional cren
mento da Sagrada Eucaristia. ça cristã de que Cristo está ver
Clemente de Alexandria resume dadeiramente presente no sa
a interpretação quando diz que: cramento eucarístico, apreciará
“A Igreja alimenta seus filhos o nosso grande cuidado pelos
39
moribundos em Nicéia: “Com ceber a Eucaristia, dê-lha o bispo
respeito aos moribundos, a antiga após devida investigação (Câno
lei canónica continuará a ser ob ne 13). “Viático” quer dizer pro
servada, a saber: se alguém es visão para um caminho, para uma
tiver perto da morte, não seja jornada. Nós cristãos somos todos
privado do último e mui neces viandantes rumo ao céu, mas Cris
sário Viático... no caso de al to é sempre “o caminho, a verda
guém moribundo que deseje re de e a vida” (Jo 14, 6).
40
S E G U ID O R E S D E C R IS T O
OU DE CONSTANr
Alegada dependência ecle versal e . .. intimou os bis
siástica. Nesta entrevista pos a reunir-se imediata
final procurarei respon mente”. Refere o discurso
der a algumas das ques dêle ao concílio sôbre a or
tões que você me subme dem, e os seus mandatos
teu. De tôdas elas, a mais de observar decretos (Eu
inquiridora parece ser a sébio, Vida de Constanti
seguinte: no, III, 6, 12, 20). Essen
“O Sr., ó Bispo Eusé cialmente, pois, os Srs. são
bio, disse que a Igreja, constantinianos antes que
Cristã é uma sociedade or cristãos; os Srs. bispos,
ganizada sob os seus pró podem pensar que go
prios titulares, ou sejam, o vernam a Igreja, mas na reali
po de Roma, que diz ser dade são deputados do imperial
deiro de Pedro, e outros bispos, departamento de religião”.
sucessores dos Apóstolos escolhi Privilégios de Constantino. Até
dos por Cristo. O Sr. acentuou aí o nosso intrépido objetor. Em
muito a continuidade em autori resposta, posso apenas bater no
dade, e a unidade e consistência peito por certas afirmações im
no ensino católico desde Nicéia, prudentes formuladas na minha
para trás, até Cristo. Contudo, projetada Vida de Constantino.
hoje me parece que a Igreja su Os meus colegas têm-me às vê
plantou o cristianismo. A sua or zes advertido da minha excessiva
ganização é uma mera imitação deferência para com a autorida
do nosso excelente govêrno impe de secular, e vejo que em parte
rial. Ela fica sendo uma socieda êles podem estar certos. Contu
de, talvez, porém optativa, depen do, é difícil para um amigo ín
dente, e, se o Sr. me perdoa o timo de Constantino falar mal
têrmo, parasitária. Como verea dêle, e de qualquer modo, eu pen
dores numa cidade, chefes sôbre so que todos os cristãos têm pa
Estados, presidentes de comuni ra com êle uma dívida de gra
dades de trabalhadores, os Srs. tidão que nunca podem pagar,
bispos limitaram o govêrno pró por haver êle acabado com as
prio sob o supremo mando impe perseguições. Foi por isto que o
rial. O Sr. mesmo diz que o Im Papa Silvestre e o resto de nós
perador “convocou um concílio uni bispos concedemos a êle uma po-
41
sição privilegiada. Tanto por mo dade senão vinda de Deus, c as
tivo de respeito como por moti que existem foram ordenadas por
vos prudenciais de eficiência, nós Deus. Portanto, aquêle que re
lhe permitimos fazer as notifica siste à autoridade resiste à or
ções para esta reunião, e assegu dem de Deus, e os que resistem
ra r transporte seguro. Pareceu- trazem sôbre si a condenação...”
me simplesmente justo convidar (Rom 13, 1).
Sua Majestade para falar à as Deixando de lado êsses relatos
sembleia, e também lhe concede marginais, veja o que a política
mos publicar os decretos conci oficial de Constantino é para com
liares. a religião. Refiro-me ao Edito
O Estado Constantino. Mas da Liberdade Religiosa promul
creio que o próprio Imperador gado por êle e pelo seu último
Constantino está bem cônscio da colega, Licínio. Deixe-me citar-
sua verdadeira posição. “Não foi lhe alguns trechos a êle pertinen
sem razão que certa vez, quan tes: “Percebemos desde há mui
do conversava com um grupo de to que a liberdade religiosa não
bispos, êle deixou cair uma obser deve ser negada, mas que ao juí
vação, de que também êle era um zo e desejo de cada indivíduo de
bispo, falando a êles sob minha ve ser permitido cumprir os seus
escuta como segue: “Os Srs. são deveres religiosos de acordo com
bispos cuja jurisdição está den a sua própria escolha, demos or
tro da Igreja. Eu também sou um dens para que todos os homens,
bispo, ordenado por Deus para os cristãos como outros, possam
vigiar o que é externo à Igreja” preservar a fé da sua própria
(Eusébio, Vida de Constantino, seita e religião. . . estando clara
IV, 24). Ora, conquanto alguns mente de acordo com a tranqui
tenham levado a mal êsse meio- lidade dos nossos tempos que ca
gracejo, eu penso que nenhum da um tenha a liberdade de es
homem equilibrado interpretaria colher e de adorar qualquer di
essa observação como reivindican vindade que lhe apraza. Isto foi
do mais do que um poder de po por nós feito a fim de que de
lícia para a ordem pública, ou, modo algum parecesse discrimi
no máximo, um papel protetor narmos contra qualquer catego
para com os interêsses e a pro ria ou religião” (Eusébio, Histó
priedade eclesiástica. Foi neste ria, X, 5). Êste edito é, a meu
espírito que êle fêz de árbitro en ver, de mentalidade um tanto
tre nós e os Donatistas africa larga demais, porém nenhuma
nos' (Eusébio, História, X, 5-6). renúncia do controle secular sô
Quanto à sua “ordenação divina”, bre a religião poderia ser mais
penso que êle poderia pleitear clara.
justificação junto ao Apóstolo Independência Eclesiástica. Mas
Paulo, quando êste diz: “Seja ca que seria se algum futuro impe
da um sujeito às mais altas au rador transpusesse os limites que
toridades, pois não existe autori Constantino *se impôs? Esta pos-
42
metais nos negócios da Igreja, e
nem nos deis ordem referente a
ela, mas, ao invés, aprendei de
nós. Deus colocou em vossas mãos
o Império, e a nós confiou a ad
ministração da sua Igreja; e, as
sim como se oporia à ordem de
Deus quem quisesse roubar de
vós o govêrno, vós também vos
tornaríeis réu de um grave pecado.
Escrito está: “Dai a César o que
é de César e a Deus o que é de
Deus”. Portanto, não nos é líci
to governar a terra, nem vós ten
des o direito de queimar incenso”
(Hósio, Carta a Constantino, ci
sibilidade, devo admiti-lo, pertur tada por Atanásio, História dos
bou-me tanto, que eu consultei Arianos, 44).
meu colega, o Bispo Hósio de
Córdova, deputado do Papa Sil Mas não hostilidade. Alegro-
vestre em Nicéia. Hósio compar me de que Hósio me tenha relem
tilha a minha amizade e respei brado a própria declaração d|
to para com o Imperador Cons Cristo sôbre esta questão. Por
tantino. Sem embargo, assegu que Cristo enfrentou o dilema lan
rou-me que, se êste governante çado aos homens religiosos em
ou qualquer dos seus sucessores todos os tempos: Credes em Deus
e numa vida futura? — então
deveis ser traidores do Estado e
relaxados nesta vida. Obedeceis
às leis e cumpris os vossos de
veres cívicos? — então não po
deis servir a Deus ou à sua Igre
ja. Ora, isto é grosseiramente in
justo. Isso toma estupidamente
como pressuposto que um homem
não pode servir conjuntamente
a Deus e a César, que um ho
mem só pode preparar-se conve
nientemente para uma vida futu
ra omitindo-se nesta vida terre
na. Providencialmente, pois, Cris
se intrometesse na Igreja, na sua to mostrou que os deveres para
fé ou na sua disciplina essencial, com a Igreja e para com o Es
então, asseverou Hósio, eu lhe di tado podem ser conciliados: “Dai
ria francamente: “Não vos intro a César o que é de César e a
43
Deus o que é de Deus” (Mt do um homem cujo coração está
22 , 21 ) . fixado em Deus; não me alicieis
Nem agiu diferentemente o com coisas materiais” (Carta aos
principal deputado de Cristo, Si Romanos, 6).
mão Pedro. Escrevendo de Ro Deve êle estar disposto a de
ma no próprio tempo em que o sempenhar o papel de um desin
tirano Nero incendiava os cris teressado construtor moral: “Os
tãos nos seus jardins, Pedro in cristãos não se distinguem do res
tima: “Sêde sujeitos a tôda cria to da humanidade por país, ou
tura humana por amor de Deus; língua, ou costumes... Tomam
se ao rei, como soberano; se aos parte em tudo como cidadãos, e
governantes, como por êle envia suportam tudo como estrangei
dos para vingança contra os mal ros . . . Obedecem às leis estabele
feitores e para louvor dos bons. cidas, mas, na sua vida privada,
Porque esta é a vontade de Deus, elevam-se acima das leis. Amam
que, fazendo o bem, façais emu todos os homens, mas por todos
decer a ignorância dos homens são perseguidos... Fazendo o
tolos. Vivei como homens livres, bem, são punidos como malfeito
embora não usando a vossa liber res. .. Numa palavra, o que a al
dade como um véu para a malí ma é no corpo, isso os cristãos
cia, mas sim como servos de são no mundo. A alma está di
Deus. Honrai todos os homens; fundida por todos os membros do
amai vossos irmãos; temei a corpo, e os cristãos por tôdas as
Deus; respeitai o rei” (1 Ped 2, cidades do mundo. A alma está
13-17). E, no entanto, quando in no corpo, mas não é do corpo;
timado a fazer alguma coisa con assim os cristãos habitam no
tra a sua consciência, êsse mes mundo, mas não são do mundo. . .
mo Pedro declarou: “Devemos A carne, embora não sofrendo
obedecer a Deus antes que aos mal da alma, contudo odeia-a e
homens” (At 5, 28). lhe move guerra, porque é impe
Desinteresse cinstão. Assim o dida de condescender com as suas
cristão profundo deve ser um ho paixões; assim, também, o mun
mem de coração leve, porque não do, embora não sofrendo mal dos
irrevogàvelmente apegado a qual cristãos, odeia-os porque êles se
quer coisa neste mundo. Pode di opõem aos seus prazeres. A alma
zer com Inácio: “Nem os reinos ama a carne que a odeia. . . ;
dêste mundo nem os limites do assim também os cristãos amam
universo podem ter qualquer uso aquêles que os odeiam. A alma
para mim. Eu preferiria morrer está fechada no corpo, e no en
por Jesus Cristo a governar até tanto é a verdadeira coisa que
os últimos confins da terra. Meu
interêsse é por Aquêle que mor mantém o corpo unido; assim tam
reu por nós; meu amor é Aquê bém os cristãos estão fechados no
le que ressuscitou para nossa sal mundo como numa prisão, e no
vação. .. Não se entrega ao mun entanto são precisamente êles que
44
mantêm unido o mundo. . ( Car Sacrifício Eucarístico. Esta Igre
ta ct Diogncto, 5-6). ja Católica é independente de Cé
Conclusão. Fiz o que você pediu. sar, mas não é oposta a César;
Como melhor pude, em tão curto sem dúvida, nós olhamos a uma
espaço de tempo, expliquei o fun vida melhor, mas esperamos ga-
i do do nosso Concílio Niceno. Ao nhá-la sendo bons cidadãos nesta.
menos espero ter-lhe mostrado Dê a isto alguma reflexão;
que a História da Igreja Católi olhe para algumas das minhas
ca, de Cristo até Nicéia, é basea fontes. Eu simplesmente desejo
da cm fatos; que não há coisa se mostrar-lhe a verdade. O mesmo
creta suspeita sôbre ela. Não torci desejou Cristo, meu Mestre;
silogismos para advogar uma cau “Meu reino não é dêste mundo.
sa, mas estatuí os fatos tão obje Se meu reino fôsse dêste mundo,
tivamente como pude. Permitem- meus ministros lutariam para que
se-me, por certo, as minhas cren eu não fôsse entregue aos judeus.
ças pessoais: que Nicéia é baseada Mas, agora, não é daqui meu rei
em fatos; que ali a Igreja Cató n o ... Sou rei. Para isto nasci
lica preservou o mesmo govêrno e para isto vim ao mundo, para
que recebeu de Cristo; que pro dar testemunho da verdade. To
fessou e sempre professará uma do aquêle que é da verdade ou
só e mesma fé; que usará os mes ve a minha voz” (Jo 18, 36-37)
mos sacramentos, especialmente o
.
Contundo: